Renê da Silva Nogueira Júnior teve prisão em flagrante convertida em preventiva

Por Clara Mariz, Giovanna de Souza, Ivan Drummond, Laura Scardua, Silvia Pires, Ana Luiza Soares* e Maria Antônia Rebouças*
Durante audiência de custódia, Ministério Público informou que o empresário responde por violência doméstica e por envolvimento em crimes de homicídio culposo e lesão corporal
O suspeito de matar o gari Laudemir de Souza Fernandes, de 44 anos, depois de se irritar com um caminhão de coleta de lixo no Bairro Vista Alegre, na Região Oeste de Belo Horizonte, deu entrada no fim da tarde de ontem no Presídio de Caeté, na região metropolitana da capital. Durante a manhã, Renê da Silva Nogueira Júnior, de 47 anos, teve a prisão em flagrante convertida para preventiva pelo juiz da Central de Audiência de Custódia. Em depoimento, o investigado voltou a afirmar que não disparou contra a vítima e não passou pelo local do crime. Na audiência, o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) informou que o homem possui registro policial por violência doméstica no estado de São Paulo e envolvimento com crimes de homicídio culposo e lesão corporal no Rio de Janeiro.

Ainda segundo Damasceno, o suspeito agiu com frieza e desproporcionalidade uma vez que logo após a “breve discussão” sacou a arma e a preparou para o disparo. Para ele, a ação demonstra que sua atitude não foi um ato de “impulso momentâneo” e sim uma decisão “consciente” e “voluntária”. “Ao sacar sua pistola e apontá-la diretamente para a motorista, uma trabalhadora no exercício de sua função, o autuado demonstrou um total descontrole emocional e uma perigosa predisposição para o uso da violência letal como primeira resposta a contrariedades do cotidiano”, afirmou o juiz.
Violência doméstica
Durante a audiência de custódia, o MPMG informou que, apesar de não haver antecedentes criminais em Minas Gerais, Renê possui registros em São Paulo e no Rio de Janeiro. De acordo com a ata da audiência, a que o Estado de Minas teve acesso, o primeiro caso se trata de uma ação penal pela prática de crime de lesão corporal grave contra uma mulher.
Já no estado fluminense o empresário responderia por lesão corporal contra uma ex-companheira, além de ameaça contra a ex-sogra. A informação foi confirmada à reportagem pelo chefe da divisão de homicídios do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) da PCMG, Álvaro Huertas. Além disso, o registro de antecedentes da Polícia Civil do Rio de Janeiro, aponta que o homem também teria envolvimento em uma ocorrência de homicídio culposo, quando não há intenção de matar.
Ao ser questionado sobre o histórico pelos seus advogados, o investigado afirmou que nunca foi preso e não responde a nenhum processo criminal. “Eu respondo por uma luxação do quinto metatarso da minha ex esposa. Mas já tenho uma medida cautelar contra ela, dada pelo Ministério Público de São Paulo”, disse Renê. A reportagem do EM entrou em contato com o MPSP em busca de informações sobre esse processo, mas recebeu como resposta que o caso está em segredo de Justiça.
Como foi o crime
Em seu depoimento à Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG), Eledias Aparecida afirmou que, enquanto recebia as instruções dos coletores de resíduos, o motorista do BYD pegou uma arma preta, fez movimento para engatilhar a arma e apontando para ela disse: “Se você esbarrar no meu carro eu vou dar um tiro na sua cara, duvida?”.
Diante das ameaças feitas à motorista, uma segunda testemunha afirmou que os demais trabalhadores tentaram acalmar o suspeito e pediram que ele seguisse seu caminho. Mesmo assim, segundo o boletim de ocorrência, o homem desembarcou com a arma em punho, deixando o carregador cair. Ele então o recolocou, manobrou a arma e efetuou um disparo em direção a Laudemir. O gari chegou a ser socorrido e encaminhado para o Hospital Santa Rita, no Bairro Jardim Industrial, em Contagem, mas faleceu.
Imagens de câmera de segurança flagraram o momento em que a vítima sai correndo já ferida. Na gravação, é possível ver o momento que o carro, que seria do investigado, vira na rua em que o caminhão de coleta estava parado. O veículo então para por um segundo, segue em frente e os demais que estavam atrás passam a dar ré e sair da via. Na sequência, dois garis saem correndo e um deles coloca a mão na região do abdômen e cai no chão. Ele é amparado por um colega que segura sua cabeça.
Identificação do carro
Renê foi identificado pelos policiais militares a partir de números parciais da placa do carro que dirigia repassados pela motorista do caminhão e imagens de câmera de segurança. Em depoimento, Eledias Aparecida afirmou que, depois que Laudemir foi atingido, ela tentou conferir a identificação do BYD pelo retrovisor, mas conseguiu ver uma letra J e os números 77. Já no boletim de ocorrência, consta que os policiais perceberam, em gravações, que a chapa começava com SJ. Assim, os policiais fizeram buscas no sistema e descobriram a combinação de números e letras.
Em seu depoimento na Central de Audiência de Custódia, o investigado alegou que o carro flagrado no local do crime não era dele. Ele justificou dizendo que seu veículo é híbrido – ou seja, tem motores elétricos e a combustão – e o da imagem mostrada a ele na abordagem policial se tratava de um modelo, da mesma marca, totalmente elétrico. O empresário também alegou que o carro registrado nas imagens apresentava uma lateral cromada, detalhe que o veículo dele não teria. “Não são os mesmos carros”, disse o suspeito aos policiais, de acordo com depoimento dele.
“O crime foi cometido em plena luz do dia, por motivo fútil, uma aparente irritação decorrente de uma breve interrupção no trânsito causada por um caminhão de coleta de lixo”
“Ao sacar sua pistola e apontá-la diretamente para a motorista, uma trabalhadora no exercício de sua função, o autuado demonstrou um total descontrole emocional e uma perigosa predisposição para o uso da violência letal como primeira resposta a contrariedades do cotidiano”
Leonardo Vieira Rocha Damasceno
Juiz da Central de Audiência de Custódia, que converteu em preventiva a prisão de Renê Nogueira Júnior
O boletim de ocorrência também informou que o carro flagrado na cena do crime era um BYD Song Plus na cor cinza, modelo que a esposa do investigado, a delegada da PCMG Ana Paula Balbino Nogueira, tem registrado em seu nome.
Divergência de horários
Na delegacia da PCMG, na noite de segunda-feira (11/8), acompanhado de seus advogados, o empresário prestou depoimento. Segundo o delegado Evandro Radaelli, da Delegacia de Homicídios, o homem negou ter cometido o crime. Ele afirmou que não estava no local no momento do crime e sim na fábrica da empresa de alimentos que trabalhava em Betim, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. Ainda segundo a versão do suspeito, depois do expediente ele teria ido para casa, no Condomínio Vila da Serra, em Nova Lima, também na Grande BH, passeado com seus cachorros e em seguida ido para a academia. A narrativa voltou a ser repetida na manhã desta quarta-feira (13/8).
O álibi, conforme o delegado Álvaro Huerdas, chefe do DHPP, foi refutado pelas testemunhas do crime, que durante as oitivas afirmaram que o homem que disparou contra Laudemir se tratava de Renê. Agora, os investigadores da PCMG seguem em busca de imagens de câmera de segurança que indiquem o que teria acontecido.
No entanto, conforme informado à reportagem pela empresa em que o homem trabalhava havia duas semanas, imagens de câmeras de segurança da unidade, no Bairro Pingo d’Água, registraram a entrada de Renê às 9h18 e sua saída às 12h30. Em nota, a empresa afirmou que as gravações foram encaminhadas para a PCMG, que agora vai analisar as imagens.
“O que nós temos são testemunhas presenciais que confirmaram, com certeza, na visão deles, de que ele seria o autor do disparo que matou a vítima”, afirma o delegado.
Envolvimento da esposa
Desde a prisão do suspeito, a Corregedoria da polícia civil instaurou um procedimento disciplinar e inquérito policial “para apurar, com rigor e transparência, todos os elementos relacionados à eventual conduta de uma delegada que possui vínculo pessoal com o suspeito detido”. Segundo Álvaro Huerdas, em coletiva de imprensa na tarde de terça-feira (12/8), as provas adquiridas pela corporação, até o momento, não indicam participação da delegada no crime.
Mesmo presídio
O empresário Renê da Silva Nogueira Júnior, suspeito de matar o gari Laudemir de Souza Fernandes na segunda-feira (11/8), em Belo Horizonte, deu entrada no Presídio de Caeté, na Grande BH, na noite dessa quarta-feira (13/8). A informação foi confirmada pela Secretaria de Justiça e Segurança Pública (Sejusp). A unidade prisional é a mesma para onde foi encaminhado Matteos França Campos, de 32 anos, suspeito de matar a própria mãe, a professora Soraya Tatiana Bonfim, encontrada morta, em Vespasiano, na região metropolitana, em julho. Ainda na noite de segunda, Renê foi levado para o Centro de Remanejamento do Sistema Prisional da Gameleira (Ceresp Gameleira) e hoje, após a audiência de custódia, foi transferido para Caeté, onde segue à disposição da Justiça.
O delegado explica que o fato de a arma que teria sido usada no homicídio estar no nome da servidora do governo de Minas Gerais “não necessariamente” a coloca como coautora ou partícipe da ocorrência. A participação só será indicada caso fique constatado que a mulher entregou o armamento para o marido. “O que nós temos é uma arma de fogo regularmente registrada em nome de uma delegada de polícia que foi entregue tanto ao departamento quanto à corregedoria.”
‘Não era para ele estar ali’
A morte de Laudemir continua gerando comoção nas redes sociais e entre seus colegas. De acordo com as testemunhas do crime, o gari fazia parte de uma outra equipe que trabalhava na Região da Serra, na Região Centro-Sul de BH. O funcionário foi realocado de rota para substituir um colega. Eledias Aparecida Rodrigues, a motorista do caminhão, contou que saiu da garagem da empresa sozinha e se encontrou com o gari na regional localizada no Bairro Salgado Filho, na Região Oeste da capital, às 8h15 e foram juntos até o Vista Alegre, onde se reuniram com os outros três colegas e iniciaram o trabalho por volta das 8h40.
Durante o trajeto, Laudemir contou a Eledias que tinha acabado de conseguir a guarda da filha de 15 anos. Ela relatou que o gari estava preocupado em chegar em casa antes das 18h, pois haveria uma visita do conselho tutelar para vistoriar a nova casa da menina. O expediente era para ter se encerrado por volta das 17h30, a tempo para a visita. Texto extraído do site Estado de Minas