Rumo à era dos mastodontes

8

Por Robério Sulz

A atmosfera de nossa nave Terra atingiu em dezembro do ano passado a concentração de CO2 na atmosfera sobe a 407 ppm (parte por milhão).  O que significa isso? Que estamos próximos de chegar a um planeta igual ao da era dos mastodontes, dos hominídeos, mais macacos que humanos, coisa entre 100 mil e 200 mil anos atrás, quando a atmosfera continha CO2 quase nada mais que nossa taxa atual. E no “pique” que estamos indo falta só um pouquinho de tempo e a estrada está encurtando a cada dia. Incrível! Parece que tem muita gente com pressa de chegar lá.

Até as vésperas da era industrial os níveis de CO2 no ar estavam estabilizados em 280 ppm. De lá para cá vêm crescendo absurdamente. No ano 2000, quando da Cúpula da Terra, realizada no Rio de Janeiro, o nível havia atingido 356 ppm, revelando um crescimento médio já considerado dramático de 1% ao ano.  O valor disparou para 2% nos primeiros anos deste século e, ano passado, essa galopante taxa atingia o patamar de 3% ao ano.

Já expusemos aqui nesta coluna, sem dramatização, que, mantidos o modelo e o ritmo de consumo de bens naturais pelo homem, precisaremos de três planetas Terra para sustentar a população projetada para o ano 2050. E com as taxas de CO2 em incrível ascensão? Onde, ou melhor, QUANDO vamos parar?

O gás carbônico é subproduto de toda e qualquer queima de material orgânico, petróleo, lenha, carvão etc.; dos processos fermentativos, da respiração dos seres vivos etc. Quase todo processamento energético em nosso planeta gera CO2 como subproduto. Portanto, quanto mais gente a queimar calorias, mais gado no campo a respirar e a bufar, mais aves nos criatórios, mais veículos circulando, enfim, mais lenha na fogueira, mais dióxido de carbono na natureza. Os países sob desvairada competição econômica estão pouco se lixando para isso. Para eles, o bonito é ver suas chaminés vomitando fumaça; o que vale é ser economicamente competitivo, quer na mão de obra, na geração de lixo, na inovação de doenças, quer, em suma, no emporcalhamento do mundo, com inúteis bugigangas “xing-ling”. A felicidade de seu povo é infelizmente paramentada pelo PIB ou pelo índice de crescimento econômico, mesmo que o ganho assim obtido venha a ser consumido para comprar máscaras respiratórias, remediar excessos de peso corporal, avitaminoses, pandemias e depressões decorrentes do pouco afeto de relacionamento interpessoal.

Os chamados países desenvolvidos arrasaram suas florestas, seus campos, seu manto verde e ainda têm a cachimônia de ameaçarem internacionalizar nossa Amazônia, certamente, para abiscoitarem com exclusividade “um lugar à sombra”. Ora, que eles fiquem por lá com seus desertos e deixem em paz nossa grande moita.

Quantidades excessivas de CO2 na atmosfera provocam males diversos. Porém, o mais sério deles é, sem dúvida, o efeito estufa, ao absorver energia dos raios solares e reter o calor na atmosfera próxima da superfície do planeta. É o efeito estufa que tem elevado ano após ano a temperatura da Terra e ameaçado seriamente o equilíbrio existencial do conjunto de todos os seres vivos, que chamamos de biosfera. A temperatura média na superfície terrestre tem aumentado em escala alarmante: no século passado subiu quase um grau centígrado e promete subir até dois graus quando o nível de CO2 chegar a 450 ppm. Embora o valor dois graus aparentemente seja irrisório, lembremos que a biosfera funciona como um organismo vivo dependendo da perfeita harmonia interativa entre suas partes, como o corpo de um cachorro ou o nosso próprio corpo humano. Que ocorre quando a temperatura de nosso corpo sobre dois graus centígrados? Febre, sensação de frio, suor, desânimo, fastio, sono e outras mazelas. Pode levar à morte se persistente e não controlada.

Dá para dizer que a espécie humana está ameaçada de extinção, sua sobrevivência nessa mixórdia está por um fio. Depende de atitudes que vão desde as de um inocente garotinho até a dos graúdos governantes, vistos como “donos do mundo”. Depende, acima de tudo, de reconhecer com seriedade as ameaças à nossa espécie, entre elas: o consumo irresponsável, o desperdício, os níveis de carbono despejados na atmosfera pela irracionalidade industrial, a competição primitiva pela posse, pelo desvairado acúmulo de bens (no fundo, reservas energéticas), pela má administração do dinheiro público (desperdício da energia aportada pelo povo).

Os fatalistas dizem que o mundo vai acabar – mesmo – um dia e que pouco adiantam esforços para adiar seu fim. Certamente não deve ser esse um bom raciocínio! Talvez valha mais a pena desativar, imobilizar, congelar essa gente que tem pressa de acabar com o mundo, a menos que não nos importemos em mandar nossos filhos, netos, bisnetos etc. de volta às cavernas para conviver com os mastodontes.

*Roberio Sulz é biólogo e biomédico pela UnB; M.Sc. pela Universidade de Wisconsin, EEUU, pensador por opção. [email protected]. Crônica publicada em 6 de julho de 2013