Português do Dia a Dia (25 de junho/2014)

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A Copa do Mundo de Futebol, por isso e por aquilo, tem trazido muitos termos ao ar. Um deles é o elemento “hexa”, badaladíssimo no momento, cujo significado é seis. Antes deles, nesse aspecto dos elementos mórficos, aparecem, na escala crescente, “tetra” e “penta”, respectivamente, quatro e cinco. Em seguida, vem “hepta”, sete. Para formar o derivado, basta que um deles se junte a um vocábulo que lhe dê sentido: tetracampeão (campeão quatro vezes), pentacampeão, hexacampeão, heptacampeão. Isso ensina a quem escreve que há as grafias bicampeão e tricampeão, muito comuns em vários esportes, e que não se pode escrever, por exemplo, “bi campeão”, como alguns o fazem. Tenho dito.
O mais engraçado, porém, é que existe quem não saiba pronunciar nem escrever “hexa”. O vocábulo, para ser assimilado, precisa ser falado e ouvido, isto é a pronúncia (a Fonologia); precisa ser escrito e poderia ser flexionado (a Morfologia e a Ortografia). Essa ortografia, no caso de dúvida, deve ser consultada no dicionário, além de ter o seu significado (que faz parte da semântica, objeto do dicionário). Para nós, no popular, é a definição da palavra. Quando o usamos em frases faladas ou escritas, ele se insere na Sintaxe. A pergunta comum é “ – O que é hexa?” O outro, então, com toda a sua sabedoria, explica-o. Então, explique o que é “cabra-da-peste”. Ou pergunte: O que é cacimba? O que é tecido adiposo? O que é um terreno argiloso? O que é uma birra de criança?
Dizer que o jovem não tem condição de saber essas coisas é uma afirmação duvidosa. Ele sabe tanto outras coisas! O xis de hexa tem o mesmo aspecto fônico ou fonológico de sexo, fixo, complexo, crucifixo etc., em que tem o valor de cs, ou ks, como dizem os compêndios. Se você pronuncia corretamente, se o jovem moderno sabe pronunciar “Alexsander”, por que não sabe fazer a mesma coisa com “o hexa”, tão desejado? Não pode ele, nem eu, nem você, usar “ficso”, e arranjar qualquer justificativa. Fica grosseiro. Se se escreve de forma errada o nome de alguém, ele vira bicho. Assim, é preciso que não haja muita desculpa – a pronúncia de hexa é “héksa”, e a grafia não pode ser mudada.
O professor fica triste com o nível escolar deste País – as escolas não querem mais treinar os nomes. Temos, a todo custo, que fazer ditado – é cafona? Não! É necessário. Temos que consultar dicionário – é perda de tempo? Não! É necessário. As facilidades têm trazido vários prejuízos. Aliás, já tive aluno que me corrigiu em sala – Ele disse que se usa “Eu tinha trago”, e que ‘trazido’ está incorreto. Não, meu caro! O verbo trazer não é abundante. Seu particípio passado é apenas trazido, e pronto. “Trago” é forma verbal do presente do indicativo – eu trago minha bagagem (do verbo trazer). Eu trago quando fumo charuto (do verbo tragar). Nada mais. Repitamos – eu tinha trazido, eu tinha ido, eu tinha chegado, eu tinha falado, eu tinha chegado, eu tinha vindo, eu tinha mostrado, eu tinha pagado (pago) a conta. Somente, a conta foi paga. A conta não foi ‘pagada’.
Se estou indo longe, meu caro leitor, tenha um pouco de paciência, que o comentário lhe pode tirar alguma dúvida. No frigir dos ovos, sobra uma coisinha útil. Vamos lá.
O jornal mostrou que o jovem escreveu na rua “equiça”, para o espanto de todos nós. Isso para corresponder a “hexa”. Se duvida do comentário, procure na sua amiga “net”, que vai achar. Temos, muito parecido, ‘quiçá’, advérbio de dúvida – Quiçá, o Brasil vai ser hexa! Talvez. Quem sabe!
O que vejo nesses casos? É que temos a mania de mudar a grafia de muitos nomes – Alessandro, em Italiano; Alejandro, em Espanhol, Alexander, em Inglês, cuja historiografia, ou Gramática Histórica, deu Alexandre em Português, essa grafia bonita, máscula, ‘Alechandre’, de Alexandre Magno, de versos alexandrinos, que, em nossa Flor do Lácio, vem-se tornando de péssima repercussão: criam “Alexsander”, “Alex-Sander”, e outros modos, grafias que não se capitulam em nossa Gramática Normativa ou no nosso Vocabulário Onomástico, aquele que lhe ensina a grafia de nomes próprios. Consulte aquela parte “Que nome darei a meu filho?”, que verá essa explicação. Muito mais bonito que a moça se chame Alexandra. Aliás, quem optou por Alessandra, que seja! Melhor assim, que nomes, estapafurdiamente, inventados. E não são neologismos. O neologismo, termo novo a partir de um vocábulo, é dizer que o Brasil vai “hexar”, que Teodoro vai “teadorar” Teresa, sua noiva; que um candidato ruim a presidente da República vai “votilizar” o Brasil de ponta a ponta, com a ironia de que nos vai hostilizar, que vai ‘volatizar’ a boa-fé do eleitor, porque, sendo eleito, se evapora com “arcanfor”, sem o olor elástico e gostoso da cânfora. Isso é neologismo. Leitor, não confunda isso com licença poética, com o “vasmecê” do caboclo, falado tão espontaneamente; não confunda essa grafia – que não deveria continuar – com “lixúria”, em que o poeta quer dizer que o lixo no País, de tão nobre, parece a luxúria do poder aquisitivo – consome-se demais, e se joga tudo em qualquer lugar. Leve o lixo como troféu para casa. Que desabafo é esse? O poeta inova quando usa Don Giovanni? Não, apenas, substitui Don Juan, em Espanhol, por essa grafia, em Italiano.
Colocaram no jornal – “Neymar não brilhou como na estreia contra a Croácia. Sem a inspiração do craque, a Seleção Brasileira fica órfão (sic) do talento dentro de campo”. A Seleção fica órfã. O povo é que fica órfão de talentos que escrevem bem, como o craque joga.
Uma frase esplêndida, educativa, solidária, solícita, talvez, ‘filantrópica’ – ‘Não fume neste ambiente, em benefício dos colegas. Se não fumar em lugar algum, o benefício será seu”. Está no bar de Juarez, no Mercadão, nesta Cidade. Parabéns. * João Carlos de Oliveira, professor jubilado, formado em Letras, com especialização em Língua Portuguesa; advogado, pós-graduado em Direito Civil, membro-correspondente da Academia Cachoeirense de Letras (de Cachoeiro de Itapemirim, ES), poeta, cronista, colunista linguístico. Acesse www.clubedeautores.com.br, e adquira ‘Em cada canto’.