Português do Dia a Dia (22 de abril/2015)

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‘Problema jurídico’ ou ‘problema judicial’? O que dizem os doutos? O que é jurídico? O que é judicial?
Suscitemos uma discussão sobre essa forma de se dizer.
Já ouvi alguém dizer que ‘problema jurídico’ é apenas uma expressão, como se fosse um regionalismo.
Consultando o léxico, para a firmeza de analisar o aspecto semântico dos termos, ambos a tramitar no Direito, encontra-se o seguinte: jurídico é o que é próprio da lei, que está de acordo com as normas do Direito; judicial é referente ao juízo (o grau de jurisdição que presta o serviço a quem recorre ao Direito). E ainda: judicial é o mesmo que forense, judiciário. A propósito, judicante refere-se a quem julga (o emérito Julgador); o mesmo que judicativo.
Começa a haver uma diferença entre o significado de um termo comparável ao outro. Vejo, entretanto, que o que se chamaria de ‘problema jurídico’ deveria ser – de forma mais clara – problema judicial, referindo-se à aplicabilidade da lei, à prestação jurisdicional.
Quando alguém, como eu já o fiz, vem a dizer ‘problema jurídico’, quer-se dizer que um cidadão está sendo desassistindo, que cláusulas da Carta Magna não estão sendo bem aplicadas, que se deixou de dar o devido amparo a algum necessitado de assistência ‘jurídica’, ou melhor, de assistência judicial. Se tratamos de um tema do Direito – da cláusula pétrea, por exemplo –, entendemos que se trata de direitos e deveres capitulados nos códigos, e na Constituição. Entende-se isso como ‘discussão jurídica ou debate jurídico, tema jurídico, suscitação jurídica’. Se o Executivo descumpre a norma legal, como a Responsabilidade Fiscal, podemos dizer que se trata de ‘problema judicial’, isto é, da aplicabilidade da lei. É isso que penso, agora.
A propósito também, pessoa jurídica, como é sabido de todos, é a instituição, sociedade, associação, que, por força da lei, adquire(m) individualidade própria, distinta da das pessoas que compõem essa ‘pessoa jurídica’. Cada membro, portanto, passa a ser ‘a pessoa física’, o que cada cidadão é normalmente em seu dia a dia.
Convidemos o especialista, indiretamente, para dizer alguma coisa sobre a aplicação do jurídico e do judicial.
A fala tem a ver com a mímica? Em parte, como se pode perceber no falar de cada um. Essa parcela está mesclada ao linguajar simples, culto, erudito, ou prolixo de alguns. É que a mímica é a arte da comunicação pelos gestos. Faz parte da linguagem não-verbal: gestos, mímica, sons, ruído, cores (O branco preconiza a Paz). O toque-toque na porta de alguém, como bater palmas, ou tocar a campainha, provoca um chamado. Ou se fala: “Ô de casa!”
O mugido do gado vacum pode indicar medo, procura pelo companheiro que se afastou desapercebidamente ou socorro. A coruja que pia chama o filhote para o banquete daquele momento.
Até aí, não se escreveu um vocábulo ou nada se falou, o que seria a linguagem verbal. Por isso, a linguagem não-verbal.
O que me incomoda é que alguns falantes usam, de forma concomitante, a mímica quando se expressam – quando dizem que deram um telefonema, fazem o gesto com as mãos no próprio ouvido. Se estamos distante de alguém, e não seria conveniente gritar por respeito ao outro, podemos fazer o gesto com as mãos nesse sentido. Isso é bom. Alguém conta uma história e diz que ‘quebrou o braço à direita’ para virar a rua, mas, ao mesmo tempo, e repetidas vezes, ‘dobra o braço para lá e para cá’. Isso não é bom.
Falar e fazer gestos ao mesmo tempo faz a comunicação ficar chata, enjoada. Ficaria legal o maestro ou a maestrina dirigir a orquestra, fazer uso da batuta, e, além disso, ainda falar? Fica bonito o maestro ‘dar as ordens’ falando alto? Claro que não. Não ficaria agradável que o maestro, mesmo em tom baixo, falasse e usasse a batuta ao mesmo tempo! Isso não existe.
O falante que usa sua voz e faz gestos, repetidos, e por muito tempo, está ‘danificando’ a linguagem. Algum gesto, alguma gesticulação, algum toque para despertar um displicente, tudo bem. O excesso é prejudicial. Aliás, a Libras é uma linguagem fantástica, justamente por que a mímica predomina. A mistura da mímica da Libras e da fala de alguém torna a linguagem frágil e inadequada.
Seria bonito a criança dizer que chamou alguém ‘assoviando’ para ela, por que estaria distante, e ao relatar seu ato, assoviou e fez o beicinho devido. Isso é um caso ‘permitido’ para a alternância de mímica e fala num só momento por se tratar da linguagem infantil. Um palestrante ou apresentador, um repórter, falando e fazendo gestos contínuos, quase ininterruptos, usando ‘aí, o que acontece?, tipo assim’ etc., cria um puro torpor para a linguagem.
Ou se fala ou se faz mímica.
Uma repórter disse que a rua foi invadida por ‘uma enxurrada de água’. Que bela redundância! A enxurrada é a torrente de água pluvial, isto é, a água da chuva em quantidade maior a escorrer pelo solo, pavimentado ou não. Isso basta. Poeticamente, a enxurrada de palavras pode ser ótimo ou péssimo, a depender de cada ouvido ou da finalidade do intento poético. Se o governo não atendeu ao que determina a lei, deve haver por parte do povo, mais pisoteado que grama de estádio, uma enxurrada de reclamações. Isso é bom.
“Martir”, termo que se aplica a herói – lembre-se do 21 de Abril, o Dia de Tiradentes –, tem aparecido em reportagem escrita sem o devido acento gráfico: mártir, mártires. Deixar de acentuar palavra paroxítona terminada por R – éter, córner, repórter, suéter, revólver – é o mesmo erro que se comete em escrever “Eles tem…”, assim como o regionalismo “Os menino…”, ou como o iletrado deixa de flexionar um verbo – “Eles acabou de chegar…”. Não critiquemos os que não foram à escola. Escancaremos nossa bocarra para falar do culto que escreve ‘discriminação’ no lugar de ‘descriminação’ (da maconha) ou de ‘descriminação’ no lugar de ‘discriminação racial’.
Contra-regra, termo muito usado na TV e no Cinema, estampa uma grafia antiga; a Reforma Ortográfica determina que se use ‘contrarregra’.
Abraço.