Português do Dia a Dia (14 de julho/2013)

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O dia linguístico deve começar com bom sotaque, boa frase e boa pronúncia. O princípio é evitar que se usem pérolas com estas: “Deixe-te falar” (já está falando com alguém), “Aí… ele ‘pegou’ e falou…”, “A loja que eu trabalho”, “O que ‘qui’ acontece?” (interrompendo a própria fala, e o mesmo falante respondendo…), “O governo… ele é um inerme”, “Tipo assim… Você fala com o gerente… tipo assim”, “Ele vai ‘vim’ amanhã?” Essas agressões servem de sustentação de que elas são tão graves quanto aos erros gritantes de grafia, “tipo assim… despresíveis, a acessoria parlamentar”. 

Pode parecer inaudível, mas, infelizmente, o ‘plural’ de São João, data comemorativa, se indispensável à coesão textual, não é “Os são Joãos”, mas “Os Sãos Joões”. “Ão”, sufixo formador de muitos substantivos, comuns ou tradicionais, tem três formas de pluralização – em ões, os mais comuns (limões, talões), em ães (pães, cães), em ãos (irmãos, cidadãos, órgãos). João, antropônimo, mesmo como substantivo próprio, que passa a ser comum em ‘joão-ninguém, joão-de-barro, joão-bobo’, faz o plural Joões, embora se pareça de feia sonoridade (cacófato?). Se o plural termina em “ões”, então – Todos os Joões de minha família, João Carlos, João Elias, João Pedro; os joões-de-barro, os joões-bobos. E aqueles que aparecerem à sua frente. Os Sãos Joões do Nordeste. Os Joões da vida costumam ser atenciosos.

O cruzamento do jegue pega com a égua gera o burro, infértil (‘maninho’, na linguagem rurícola do interior do País). O jeguinho comum é filho do jumento com a jumenta, ou de um cruzamento especial de cavalo com jumenta, como ensinam alguns compêndios. Dessa miscigenação pode nascer um burrinho mirrado, mas resistente, chamado ‘bardoto’. O mais interessante, porém, cujo registro merece guarida nesta coluna, é dizer que se usa “a mula”, mas muito pouco “o mu”, o macho, também infértil, da espécie. Também chamam o mu de o burro, mas não se chama a mula de a burra. Burra tem outra conotação. Não seria isso?

Nestes dias de turbulência nacional, o termo corrupção está em evidência. A toda esquina, praticamente, se fala que o Brasil está infestado de corruptos. Certo até certo ponto, pois para haver o corrupto, tem que haver o corruptor. Não existe um sem o outro. Parece que esses dois termos não caminham juntos na linguagem popular – se em um momento se disser que fulano é corrupto, é porque sicrano o corrompeu, esse, o corruptor. Corrupto é o comandado; corruptor, o comandante (não a patente militar); com o sentido de “aquele que comanda a corrupção”.

Correto quanto à flexão gramatical, um pregador disse que “Nosso espírito é corrupto, porque somos hipócritas: falamos uma coisa e fazemos outra”. Semanticamente, fica a se discutir. E se tentarmos mudar a consciência de alguém, nosso espírito passaria a ser ‘corruptor’?; se aceitamos o corromper imposto por alguém, não somos, pois, meros corruptos?

Se este professor não estiver enganado, tem-se a dizer que, de modo geral, usam corruptos como se os envolvidos tivessem o mesmo comportamento. Faça a diferença: na corrupção ativa, há um corruptor; na corrupção passiva, há um corrupto, aquele que é o corrompido (em outras palavras). Nesse aspecto, se há corrupção no País, muitas empresas, autoras de planos mirabolantes, são simplesmente CORRUPTORAS, em letras maiúsculas.

Na coluna anterior, foi feita a comparação de ledor com leitor. Há diferenças? Ledor é termo correto? Sim, e há uma suave diferença entre eles, apesar de os termos serem sinônimos. Ledor, além de correto, indica o leitor assíduo, constante, habitual, costumeiro. Leitor, dado no dicionário com o mesmo sentido, talvez não insinue a constância do ledor, como namorador, frequentador, comedor. Etc.

Deixo em aberto, hoje, para possível comentário posterior, as expressões: “Pelo ao contrário”, “Mude tua cabeça, que você muda o mundo”, “Se você apoia o movimento, buzina”.

Finalmente, lembremos as boas grafias: anticaspa (que aparece com hífen em propaganda televisiva), por isso, anticárie; subsérie (como subsolo), e estas: minissaia, maxissaia. Se o prefixo estiver sozinho, escreva “míni”, “máxi”, cada qual acentuado graficamente. Note claramente o acento agudo.

 Um abraço.

 

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