Um estudioso da Gramática Histórica da LP disse que houve um período em que o critério ortográfico não se fundamentou em nenhuma base; foi muito ruim para a própria língua, pois a falta de uma base, como a etimologia, dificulta o uso da ortografia e da semântica; essa fase foi chamada de pseudoortografia. Os descalabros foram os maiores possíveis. Alguns corrigidos; outros, não.
Um professor de LP, como este colunista, deve conhecer esse período, estudando-o com afinco. Hoje, entretanto, apesar de haver certa evolução, parece que a escrita de alguns termos não segue o critério histórico-ortográfico e semântico adequadamente.
Acreano, que vem de Acre, nome do Estado, e não “acre”, adjetivo, que significa “azedo, ácido”, aparece em alguns textos como “acriano”, tido como certo. Isso é estranho… Estaria a fonologia sendo base para a escrita, superando a ortografia? Só isso justificaria. Essa teoria não seria aceitável. A etimologia ensina que um derivado, como acreano, deve seguir a grafia do primitivo, Acre. Se esse termo termina em “e”, o mesmo fonema deve ser conservado no termo que dele deriva. Acriano, portanto, é de origem duvidosa.
Com base nesse princípio, temos coreano, que vem de Coreia, e não seria justo que se escrevesse “coriano”, com base na pronúncia da palavra, que é um mote para a fonologia. Assim, tem-se recheado, que vem de recheio, e não seria justo “rechiado”, nem “recheiado”. Shakespeare, pós-nome do grande dramaturgo inglês (William Shakespeare), gera “shakespeareano”, tido como errado, e não “shakespeariano”, que aparece como certo. Também é estranho… Para que serve a regra? Somente para enfeite? Para atrapalhar a cabeça de quem já sabe pouco? O estudo da LP de forma decoreba seria um dos motivos de sua pífia e tenra aprendizagem. Quem diz o contrário, justificaria outros porquês?
Pompeia, cidade italiana extinta, gera pompeiano, mas aparece também pompeano, assim como Pompéu, no Brasil, deriva correta e seguramente “pompeano”, e não seria cabível aparecer “pompiano”. A lista não é quilométrica, mas a grafia de alguns termos com esse aspecto histórico provoca um bom susto.
Irã, que já se escreveu “Iran”, forma iraniano, porque o primitivo não termina em “e”, por isso, introduz-se “i” – iraniano. A mesma regra para os derivados de Machado, Wagner, Hollywood, e outros não terminados em “e”, na ordem – machadiano, wagneriano, hollywoodiano. O próprio leitor pode relacionar outros termos primitivos que vão gerar derivados terminados em “eano” ou “iano”. Um pouco de paciência serve para serem encontrados os exemplos.
Um exemplo clássico, que deturpa a regra, usando em abundância, é iraquiano. Ora, se o primitivo (Iraque) termina em “e”, não há base para a presença do “i”. Isso esse professor entende como pseudoortografia, motivo da introdução. Deve-se grafar iraqueano, que se acha, mas aparece poucas vezes.
Nesse caso, a grafia “muderno”, com base no sotaque de alguns, estaria correta! E não seria isso… Também “jugar” bola, “subjulgar” uma pessoa ou país (subjugar – deixar sob o jugo de uma potência ou de alguém), ou aquele caso de metaplasmo – “arrecardar” (arrecadar), prazeiroso (prazer+oso=prazeroso). Se houver critério livre, isto é, não seguir o que determina a etimologia – o estudo do étimo da palavra (a sua raiz ou origem) – , seria correto escrever “franquiado” e não “franqueado”, como se escreve? E assim como se escreve “alugar”, seria melhor escrever “aluguelar”, por ter referência com “aluguel”? Franquiado não vem de franquia?
O assunto é delicado e requer muita pesquisa; só um Houaiss, já falecido, ou o professor Paschoal Cegalla para dar um jeito nessa inquietação. Este colunista já demonstrou o que conhece; falta é alguém com maior grandeza completar a outra parte. Um abraço.
Coluna anterior: Você escreve biquíni, biquine ou Bikini? Multi-uso ou multiuso, multiinstrumentista ou multi-instrumentista, anti-herói ou antiherói? Resposta: biquíni, essa a grafia correta da peça feminina; biquine, como se usa às vezes no comércio não existe, e Bikini, correto, é o nome da ilha (um topônimo) que originou essa palavra. Agora, escreva multiúso (inclusive com acento, como reúne, que vem de une), multi-instrumentista (com hífen porque há duas vogais iguais juntas, conforme a nova regra), anti-herói (com hífen por causa do H, embora haja desumano, mas não existe antiumano).
Pegadinha: Você escreve piche ou pixe, distinguir ou distingüir, fogão a lenha ou fogão de lenha? Por quê?
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Divulgação dos livros de João Carlos