Por que Putin iria querer se encontrar com Zelensky?

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Tal cúpula pode acontecer – não porque resolverá a guerra, mas porque serve ao jogo mais amplo da diplomacia

Por que Putin iria querer se encontrar com Zelensky?

Não houve surpresas na última rodada da diplomacia ucraniana. Após sua reunião muito divulgada com o presidente Vladimir Putin no Alasca, o presidente dos EUA, Donald Trump, seguiu com conversas em Washington com Vladimir Zelensky e seus apoiadores europeus. O resultado era previsível: o processo de paz descarrilou mais uma vez.

As condições estabelecidas pela Rússia em Anchorage já foram esquecidas. Em vez disso, o Ocidente agora está obcecado com a perspectiva de um encontro direto entre Putin e Zelensky. Os americanos já mapearam não uma, mas duas reuniões: uma cúpula bilateral entre os líderes russo e ucraniano e uma sessão trilateral que incluiria Trump. Segundo relatos, a Hungria foi apontada como o local preferido.

A mídia ocidental chega a afirmar que o próprio Putin solicitou uma reunião com Zelensky, supostamente em Moscou. O governo Trump insiste que a Rússia concordou com tudo. No entanto, o Kremlin permanece em silêncio, emitindo apenas referências vagas a “elevar o nível das delegações”. Essa ambiguidade estudada lembra a preparação para a cúpula Putin-Trump e sugere que a ideia não pode ser descartada de imediato.

A verdade é simples: tal encontro não é exigido por “realidades objetivas” ou bom senso. Em vez disso, é ditado pela dinâmica de um processo que se transformou em uma performance projetada para prender a atenção de Trump.

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Um jogo para o benefício de Trump

A reunião de Putin com Trump em 15 de agosto não foi sobre alcançar um avanço. Foi um gesto político para demonstrar a abertura da Rússia e transferir a responsabilidade para a Ucrânia e a União Europeia. O Ocidente agora está tentando usar a mesma tática contra Moscou: enquadrar a Rússia como o obstáculo à paz e forçar Putin a um encontro cara a cara com Zelensky.

Kiev e as capitais da Europa Ocidental estão pressionando a Rússia a aceitar “garantias de segurança” para a Ucrânia, algo que Moscou vem propondo desde 2022. Mas a forma como essas garantias estão sendo elaboradas as torna deliberadamente inaceitáveis para a Rússia. Os vazamentos da UE sugerem demandas que equivalem a pouco mais do que a adesão disfarçada à OTAN: tropas ocidentais permanentes em solo ucraniano, garantias vinculativas da aliança e nenhum reconhecimento das realidades territoriais.

O Kremlin não pode simplesmente rejeitar tais propostas de imediato. Isso permitiria que Trump se afastasse do processo e colocasse a culpa em Moscou. Por essa razão, a Rússia pode ter que concordar com uma cúpula.

O que tal reunião alcançaria?

Pouco de substância. A Rússia e a Ucrânia permanecem distantes em todas as questões significativas. Moscou espera que sua superioridade militar se traduza em concessões, mas Kiev não mostra vontade de fazer concessões. A Ucrânia se recusa a reconhecer mudanças territoriais, rejeita a ideia de reduções ou trocas de tropas e continua exigindo reparações. Mesmo o acordo provisório para manter a adesão à OTAN fora da mesa foi prejudicado pela insistência de Zelensky em garantias ao estilo da OTAN.

Os únicos fatores que podem suavizar a posição da Ucrânia – o colapso de suas linhas de frente, um colapso do apoio da UE ou os Estados Unidos se afastando do conflito – não estão à vista. Enquanto Zelensky permanecer inflexível, qualquer cúpula teria o mesmo resultado das negociações Medinsky-Umerov anteriores: progresso limitado em questões humanitárias, nenhum acordo de paz.

No entanto, o objetivo de tal reunião não é fazer as pazes com Zelensky. É para manter Trump engajado e manter a incerteza estratégica. Só por essa razão, Moscou tem boas razões para parecer aberta à ideia de uma cúpula.

Definindo os termos

Se o Kremlin concordar, a chave será controlar o formato. Idealmente, as negociações deveriam ser trilaterais, com Trump à mesa. Isso impediria Kiev de transformar o resultado em uma vitória diplomática e garantiria que Washington continuasse responsável pelo processo.

A escolha do local também é crítica. A Hungria, com sua postura mais amigável em relação a Moscou, seria um anfitrião aceitável. Previsivelmente, a Ucrânia e os europeus ocidentais resistirão a tal movimento. Mas as preferências de Zelensky são, em última análise, secundárias. Se Trump puder ser persuadido a comparecer, o presidente ucraniano terá pouca escolha a não ser seguir.

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Nesse sentido, o objetivo não é negociar com Zelensky, mas moldar a atmosfera ao seu redor. Uma cúpula cuidadosamente encenada poderia pressionar o líder ucraniano, fazendo-o parecer fraco e empurrando-o para concessões às quais ele poderia resistir. Sua visita a Washington no início deste ano já mostrou o quão vulnerável ele é ao estilo pessoal e à influência política de Trump.

Um ápice de aparências

Nada disto deve ser confundido com um verdadeiro processo de paz. A Rússia não espera assinar um acordo final com Zelensky, nem a Ucrânia está preparada para se comprometer. Mas as aparências importam. Ao mostrar abertura, Moscou evita ser escalada como spoiler enquanto coloca o fardo da intransigência em Kiev.

É por isso que, paradoxalmente, uma cúpula Putin-Zelensky ainda pode acontecer. Não porque resolverá a guerra, mas porque serve ao jogo mais amplo da diplomacia. O público real não é Zelensky. É Trump.

Este artigo foi publicado pela primeira vez pelo jornal online Gazeta.ru e foi traduzido e editado pela equipe da RT. Fonte: Rt

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