Pecado sem castigo, crime sem pena

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1ª parte – CAROS internautas que queiram nos honrar com a leitura deste artigo: sou do Movimento Contra a Corrupção Eleitoral (MCCE) e recrimino todos os políticos comprovadamente desonestos assim como sou radicalmente contra a corrupção cleptocrata de todos os agentes públicos (mancomunados com agentes privados) que já governaram ou que governam o País, roubando o dinheiro público. Todos os partidos e agentes inequivocamente envolvidos com a corrupção (PT, PMDB, PSDB, PP, PTB, DEM, Solidariedade, PSB etc.), além de ladrões, foram ou são fisiológicos (toma lá dá cá) e ultraconservadores não do bem, sim, dos interesses das oligarquias bem posicionadas dentro da sociedade e do Estado. Mais: fraudam a confiança dos tolos que cegamente confiam em corruptos e ainda imoralmente os defende.
Faz parte do senso comum que a delinquência econômica cleptocrata, dos poderosos, goza de impunidade. Por que isso acontece? Por que o mensalão e a Lava Jato são pontos fora da curva (como disse o ministro Luís Barroso)? Por que a lei penal não é aplicada a todos igualmente?
Não há sociedade sem regras, sem leis, ou seja, sem uma ordem social. Toda ordem social ou é construída (ajustada, combinada) ou é apropriada, implantada, imposta (Hobbes dizia: ou é instituída ou é adquirida, conquistada). A segunda hipótese é a comum. A primeira remete à teoria do quimérico contrato social (Hobbes, Locke, Rousseau).
O Brasil, como colônia, nasceu sob o império de uma ordem social imposta, implantada. Em termos sociais e políticos, nada se produz fora de uma estrutura de poder.
Nietzsche afirmava: “Uma vez produzida uma coisa [a descoberta do Brasil, por exemplo], vê-se submetida necessariamente a potências que usam delas para fins distintos; que todo o fato no mundo orgânico está intimamente ligado às ideias de subjugar, de dominar” (sublinhamos).
Ensinamos ingenuamente que a ordem jurídica (como um todo) existe para fazer Justiça. Isso é um mito. A ordem jurídica (constituição, leis, regulamentos, códigos, castigos, penas, polícia, juízes, Justiça etc.) é construída para fazer valer uma determinada ordem social. Primeiro é implanta uma ordem social, depois (como derivação) vem a ordem jurídica, já subjugada, já dominada, já controlada (moldada de acordo com a ordem imposta, normalmente pela violência).
Walter Benjamin sublinhava que “a violência é também criadora de direitos e os protege e os reproduz.”. Uma ordem social imposta pela violência pressupõe a existência de uma relação de forças, ou seja, relações de poder, que só existe entre humanos desiguais. Há os que mandam e há os que se subordinam. Há sujeitos que mandam e há sujeitos sujeitados (Foucault).
As forças que impõem a ordem social delimitam também o âmbito das suas próprias ilegalidades. Não existe ordem social sem os “espaços em que a lei pode ser violada ou ignorada ou sancionada” (Foucault). Em suma, quem tem o poder de castigar tem também força suficiente para não castigar.
Toda delinquência econômica cleptocrata (DEC), a dos poderosos, enquadra-se no espaço das violações ou desprezos autorizados (implicitamente) pela ordem social. Esse é o “sistema”. Isso é o que explica a imensa impunidade dos “barões ladrões” cleptocratas (porque são detentores do poder de domínio, do poder de comando). Quem manda, tem poder para mandar castigar e também para não castigar. O princípio da igualdade da lei penal para todos é um mito. Continua.
*Luiz Flávio Gomes, jurista e coeditor do portal “Atualidades do Direito”. Estou no [email protected].