O que é Atenção Flutuante?

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Por Lucas Nápoli*
De acordo com o pai da psicanálise, a atenção flutuante seria a contrapartida do terapeuta à regra fundamental da associação livre que o paciente deve seguir para que a análise funcione. No início do tratamento, o analista pede ao analisando que diga exatamente tudo o que lhe venha à cabeça, mesmo que sejam pensamentos aparentemente sem sentido. A premissa que fundamenta esse enunciado é a de que determinados conteúdos que poderiam ser vistos como banais ou irrelevantes podem muito bem servir aos paradoxais propósitos do inconsciente de se revelar de forma disfarçada. Em última instância, não é possível dizer que a narrativa de uma briga com a mãe seja mais importante para o tratamento que um relato acerca do que se comeu no almoço. A regra da associação livre é uma técnica que, se seguida à risca, possibilita ao paciente seguir o fluxo de trabalho do inconsciente que, diga-se de passagem, nunca para de trabalhar. Nem na hora do almoço.
Assim, da mesma forma que o analisando deve evitar selecionar os pensamentos que irá comunicar em análise, o analista também deve escutar de forma homogênea tudo aquilo que o paciente diz, por mais bobo que pareça. O terapeuta deve, portanto, evitar fixar sua atenção em certos conteúdos, privilegiando-os em detrimento de outros. Por isso, a metáfora aquática utilizada por Freud é bastante precisa. A atenção do analista deve flutuar pelos significantes que o paciente enuncia, como um barco que perdeu o leme, evitando tomar algum fragmento do discurso como cais. A hipótese de Freud é a de que, ao fazer isso, ou seja, ao suspender sua atenção habitual e deixar-se levar pelas associações do paciente, o analista acabará por seguir o fluxo de trabalho do seu próprio inconsciente. Assim, em condições ideais, isto é, caso o paciente obedecesse fielmente à regra da associação livre e o analista adotasse plenamente a atenção flutuante, se estabeleceria uma comunicação entre os inconscientes do terapeuta e do analisando.
Foi justamente essa situação que Freud imaginou como sendo o ápice da relação analítica. Obviamente, trata-se de uma conjuntura que jamais se concretiza com perfeição. Assim como nenhum paciente se submete integralmente à regra da associação livre, não há nenhum analista que seja capaz de adotar de forma plena a atenção flutuante. A própria formação teórica do analista condiciona-o a privilegiar certas associações e relações entre determinados eventos – o que não constitui uma falha do terapeuta.
A comunicação entre inconscientes como situação ideal deve estar sempre no horizonte do analista, mas esse deve saber de antemão que jamais será capaz de alcançá-la em plenitude. Isso não significa, contudo, que o terapeuta deva resignar-se e abandonar a técnica da atenção flutuante sob a justificativa de que jamais será capaz de atingir tal estado psíquico com perfeição. Creio que seja possível ao analista adotar uma atenção flutuante “suficientemente boa”, isto é, uma atitude de receptividade total ao mais ínfimo detalhe do discurso do paciente, na qual, eventualmente, em função da experiência e do aprendizado teórico, certos conteúdos encontrem uma escuta mais – atenta.
*Lucas Nápoli é psicólogo e psicanalista.