Luthier fala sobre a desvalorização da verdadeira cultura no Brasil

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Há aproximadamente 25 anos, Gilberto Guimarães vem desenvolvendo na cidade de Teixeira de Freitas uma arte pouco difundida no Brasil, e, principalmente, no extremo sul da Bahia, a lutheria. Tornando-se um luthier [profissional especializado na construção de instrumentos de corda] e pesquisador, reconhecido internacionalmente.

Gilberto Guimarães

Gilberto já viajou por diversos países da América Latina, Europa, a fim de desenvolver uma técnica própria na constituição de seus instrumentos. No ano passado ele participou de um grande evento nos Estados Unidos, que reuniu os 50 melhores luthieres do mundo – da América Latina, além de Gilberto, apenas um outro luthier foi convocado.

Seu despertar para a arte da lutheria aconteceu após a adolescência, e se deu a partir da culminância de fatores como sua fascinação com os instrumentos, o fato de o pai ser marceneiro, e sua observância da dilaceração da Mata Atlântica, que fez brotar em si a vontade de “fazer algo de nobre com a madeira nativa”.

Tido como um pesquisador, Gilberto, autodidata, desenvolveu uma apurada técnica a partir de estudos e observações. “Minha faculdade de música foi Pixixica”, brinca ele – que hoje é reconhecida no meio acadêmico brasileiro, apesar da dificultosa “valorização da verdadeira cultura no Brasil”, diz o luthier.

“Eu diria que o maior entrave para o desenvolvimento não apenas dessa arte, como da verdadeira cultura, é a falta de incentivo governamental e mesmo municipal – porque, na maioria das vezes, as iniciativas públicas são apenas para projetos que tenham resposta política, e a lutheria não tem; se você fizer um projeto de axé, aí certamente você terá”, disse o profissional.

Segundo ele, a banalização do que é cultura é outro fator que corrobora para que, não apenas a arte da lutheria, como outras formas de verdadeira cultura, como os cantadores, os contadores de histórias, morram. “Hoje em dia, qualquer coisa que faz rebolar é cultura. O que há é uma inversão de valores, a verdadeira cultura morre, e não porque não existem profissionais, mas porque não possui espaço para eles”, lamentou.

Gilberto ainda afirma que, com o passar dos anos, ele nota que a situação tem, infelizmente, piorado. “Por mais que a internet, a facilidade de comunicação, tenha facilitado a difusão dessa e de outras artes, o incentivo e espaço que elas estão tendo no cenário municipal, estadual ou nacional é cada vez menor. Não se vê há muito tempo a organização de festivais, ou a vinda de um cantor de qualidade para a cidade, não há investimento na cultura regional, mas apenas no que é da massa e é lançado pela mídia”, ressaltou.

Neste ano, Gilberto Guimarães recebeu da Câmara de Vereadores de Teixeira de Freitas o Título Cidadão, que “foi um reconhecimento do meu trabalho, mas que não poderia parar por aí”, disse.

Atualmente, o luthier de Teixeira de Freitas faz instrumentos por encomenda para maestros no Pará, Londrina, e diversos Estados do Brasil, sendo constantemente requisitado por faculdades de música – não só no país, como também no exterior – para ministrar palestras sobre sua arte e mostrá-la ao público. Gilberto produz todos os tipos de instrumentos, e, inclusive, de instrumentos antigos como viola da gamba e hurdy gurdy, ou cravo – o pai do piano. “O instrumento é vivo, e essa arte de se trabalhar com afinco, sem que haja essa característica industrial, é importante. É fundamental a valorização da verdadeira cultura”, concluiu o luthier. Seu telefone para contato é (73) 9985-8251. Por Raíssa Félix.