Plataforma de apostas online exige pagamento adicional e não libera saldo, levando caso à Defensoria Pública
Um caso envolvendo o popular “Jogo do Tigrinho” ganhou destaque no Distrito Federal nesta semana. Um homem que acumulou mais de R$ 169 mil na plataforma de apostas online acionou a Justiça para tentar resgatar o valor, que foi retido sob a justificativa de que ele precisaria fazer um pagamento adicional via Pix para “subir de categoria” e, assim, ter acesso ao montante.
Mesmo após cumprir a exigência, o dinheiro continuou bloqueado, o que levou a Defensoria Pública do Distrito Federal (DPDF) a intervir, apontando indícios de práticas abusivas e possível golpe.
De acordo com a CNN Brasil, o apostador procurou a DPDF na sexta-feira, 14 de março de 2025, após a plataforma se recusar a liberar os R$ 169 mil acumulados. A empresa alegou que o saque só seria possível mediante o depósito de uma quantia extra, uma prática que, segundo a Defensoria, é recorrente em plataformas como essa. Após o pagamento, no entanto, o saldo permaneceu inacessível, o que motivou o pedido de reparação por danos na Justiça.
Um padrão de conduta questionável
A Defensoria Pública do DF, responsável por representar o homem, constatou que o caso não é isolado. Ao analisar sites de reclamações de consumidores, como o Reclame Aqui, foi identificado um padrão de comportamento por parte das empresas por trás do “Jogo do Tigrinho”.
Essas plataformas atraem usuários com promessas de lucros altos e saques fáceis, mas, na hora de liberar os valores, impõem condições adicionais que nunca são cumpridas. “Elas disponibilizam os jogos online, prometem o saque dos valores acumulados, retêm o saldo com pretextos diversos e condicionam a liberação a novos pagamentos“, informou a DPDF em nota.
O defensor público Antônio Carlos Cintra, chefe do Núcleo de Defesa do Consumidor (Nudecon), destacou que o “Jogo do Tigrinho” já vinha sendo alvo de preocupações por comprometer a renda de milhares de pessoas, muitas das quais desenvolveram dependência da plataforma. “Agora, ele mostrou uma nova roupagem, propiciando golpes como o do presente caso“, afirmou Cintra à CNN. Ele argumenta que há uma relação de consumo entre o usuário e a plataforma, o que implica responsabilidade objetiva da empresa, conforme o Código de Defesa do Consumidor (CDC). Isso significa que a reparação dos danos não depende de comprovação de culpa, mas sim da relação estabelecida.
Contexto nacional: O “Jogo do Tigrinho” e seus problemas
O “Jogo do Tigrinho”, também conhecido como “Fortune Tiger”, é um cassino online que simula um caça-níquel virtual. Amplamente divulgado por influenciadores digitais em redes sociais, ele promete ganhos rápidos, mas opera em um limbo legal no Brasil. Segundo o portal Migalhas, a prática é considerada uma contravenção penal sob o Decreto-Lei 3.688/41, que proíbe jogos de azar no país, exceto em casos regulamentados, como loterias oficiais. Apesar disso, a ausência de uma regulamentação específica para plataformas online dificulta a repressão.
Casos semelhantes já foram registrados em outros estados. Em Alagoas, por exemplo, uma mulher relatou ao UOL, em junho de 2024, ter “ganhado” R$ 94,9 mil no jogo, mas teve sua conta bloqueada ao tentar sacar o valor. Ela processou uma influenciadora que promovia a plataforma, alegando danos morais. Em São Paulo, a Secretaria de Segurança Pública (SSP) informou, também em 2024, que mais de 500 boletins de ocorrência foram registrados por golpes relacionados ao “Jogo do Tigrinho”, evidenciando o alcance do problema.
Impactos sociais e legais
Além das questões financeiras, especialistas apontam os impactos sociais do “Jogo do Tigrinho”. O delegado Alessandro Carvalho, secretário de Defesa Social de Pernambuco, declarou à CNN em setembro de 2024 que o jogo, por ser acessível via celular ou computador, cria um “círculo vicioso” que leva os jogadores a gastarem além de suas possibilidades, muitas vezes comprometendo patrimônios pessoais e familiares. “O algoritmo é feito para ludibriar o jogador. Em alguns momentos ele ganha, mas no final a casa sempre vence”, explicou.
No caso do Distrito Federal, a DPDF reforça que a publicidade enganosa e a falta de transparência nas regras das plataformas agravam a situação. “A publicidade é toda voltada para lucros financeiros, sem nenhum limitador. Depois, verificam-se bloqueios arbitrários e objeções não anunciadas previamente“, disse Cintra ao Correio Braziliense. A ação judicial movida pelo apostador busca não apenas a liberação do valor retido, mas também uma reparação pelos danos sofridos, o que pode abrir precedente para outros casos.
O que está em jogo?
Enquanto o processo tramita na Justiça do DF, o caso reacende o debate sobre a necessidade de regulamentação dos jogos online no Brasil. Em 2023, o governo federal sancionou a Lei 14.790, que regula apostas esportivas de cota fixa, mas jogos de azar como o “Jogo do Tigrinho” permanecem em uma área cinzenta, hospedados em servidores estrangeiros e sem representação legal no país. A Justiça de São Paulo, por exemplo, determinou em setembro de 2024 o bloqueio de 15 sites relacionados a jogos de azar, mas a medida enfrenta dificuldades práticas devido à natureza transnacional dessas plataformas.
Para o apostador do DF, a batalha é pessoal. Os R$ 169 mil representam uma quantia significativa que, segundo ele, poderia transformar sua vida. Agora, cabe à Justiça decidir se ele conseguirá reaver o valor e se a plataforma será responsabilizada por suas práticas. O desfecho do caso pode lançar luz sobre os riscos das apostas online e pressionar por mudanças legislativas mais amplas. Por Alan.Alex / Painel Eletrônico