“Foram jogados aqui como lixo”, diz moradora que viu chegada de venezuelanos a Vitória

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A TV Vitória/Record TV apurou que o Espírito Santo deve receber mais 21 venezuelanos indígenas

Foto: Reprodução TV Vitória

Um total de 25 venezuelanos indígenas, entre eles 13 crianças e um recém-nascido, foram deixados na Rodoviária de Vitória na madrugada desta terça-feira (16). Uma moradora flagrou o momento em que um ônibus, de responsabilidade da Prefeitura de Teixeira de Freitas, na Bahia, “abandonou” o grupo no local. À reportagem da TV Vitória/Record TV, ela contou com detalhes qual foi a sensação de se deparar com a cena.

“Acordei de madrugada, abri a janela, olhei para rodoviária e eles estavam na área dos taxistas. Acordei hoje e me deparei com essa cena, muito triste. O amor do próximo se acabou. Olhando essa situação, vi que o ser humano não é nada. Corta o coração. Foram jogados como lixo. Vamos ver o que a nossa autoridade, de Vitória, vai fazer. Se vão recebê-los bem”, disse Kátia, que mora em frente à Rodoviária de Vitória.

Além dos 25 venezuelanos que já chegaram ao Estado capixaba, mais 21 pessoas devem chegar ao Espírito Santo nesta terça-feira (16). A informação foi confirmada à reportagem da TV Vitória/Record TV. Sem ter para onde ir e nem ter o que comer, o grupo que chegou nesta madrugada está em um terreno ao lado da rodoviária, no bairro Ilha do Príncipe.

À repórter Suellen Araújo, que se emocionou ao vivo com a situação, Rubem, representante do grupo, conversou com a reportagem. Ele e os outros venezuelanos chegaram ao Brasil no final de 2020, em Roraima, e percorreram outros Estados do Brasil.

A motivação de homens, mulheres, bebês, jovens e idosos terem deixado o país de origem, que faz fronteira com o Brasil, é que a Venezuela vive uma crise financeira sem precedentes. Assim, a tribo veio em busca de melhores condições de vida.

No país, os integrantes da tribo já chegaram há mais de um ano, período em que peregrinam por estados do norte e também do nordeste. Por último, segundo o cacique Ruben Mata, à TV Vitória/Record TV, eles ficaram por seis meses na cidade de Teixeira de Freitas, no sul da Bahia.

Agentes da guarda municipal e uma equipe da secretaria de Assistência Social de Vitória estiveram com os indígenas para levar água e alimento. Alguns chegaram a trazer em mãos o que tinham de essencial. Nas bagagens, além dos pertences, trouxeram um sonho de conquistar o básico: alimento, moradia, emprego e dignidade.

A reportagem entrou em contato com a Prefeitura de Teixeira de Freitas, que informou que tomou conhecimento de que os venezuelanos haviam desembarcado na cidade no dia 12. “Ao encontrá-los, a secretaria providenciou abrigo provisório em uma escola, onde foram acolhidos e receberam alimentos, serviços médicos, doações. Foram feitas campanhas. Dignidade a esse povo não faltou”, disse Marcelo Teixeira, assistente social da cidade.

Em um vídeo, o representante chegou a afirmar que “eles adultos, são livres, tem direito de ir e vir. Ao identificar que, na nossa cidade, não teriam condições para viver, foram facultados para onde quiseram ir. Eles queriam transporte e escolheram Vitória. Desembarcaram como pessoas adultas. Cabe o município acolher com amor”, finalizou.

No entanto, Rubem, representante dos venezuelanos, afirmou que a fala do assistente não procede, e disse que a Prefeitura de Teixeira de Freitas disse que o ideal seria uma cidade maior.

A Prefeitura de Vitória informou que por serem estrangeiros, é um tema de atuação da Polícia Federal. A Secretaria de Estado de Trabalho, Assistência e Desenvolvimento Social (Setades), informou que a Prefeitura Municipal de Vitória comunicou a chegada dos indígenas venezuelanos da etnia Warao ao Estado. Veja nota na íntegra:

“O papel da Setades no atendimento a essa população, no âmbito do Sistema Único de Assistência Social (Suas), é prestar orientação técnica aos municípios com essa demanda, além de cofianciar os serviços que farão o acolhimento dessa população. Entretanto, o atendimento direto aos indígenas Warao é feito pela equipe municipal de assistência.

Também é de responsabilidade da Setades a notificação do Ministério da Cidadania (MIC), da Defensoria Pública da União (DPU) e do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), que já foram notificados. Além disso, por se tratar de um grupo étnico com particularidades distintas de outros grupos que já estiveram no Estado, o contato de um pesquisador da Universidade de São Paulo, familiarizado com a etnia Warao, também foi encaminhado para a equipe municipal.

Cabe reintegrar que o compromisso do Estado e dos municípios, dentro do escopo da legislação socioassistencial e da Constituição Federal, é garantir a proteção social desses indivíduos e famílias e, ao mesmo tempo, respeitar a cultura e a tradição dessa comunidade indígena”.

O que diz a Polícia Federal

“A Polícia Federal no Estado do Espírito Santo vem informar que: o Brasil editou o DECRETO Nº 9.285, DE 15 DE FEVEREIRO DE 2018, reconhecendo a situação de vulnerabilidade decorrente do fluxo migratório provocado pela crise humanitária na República Bolivariana da Venezuela.

Assim, em relação aos migrantes provenientes da Venezuela, cabe à Polícia Federal no estado de ingresso no Brasil (que normalmente é em Roraima) o cadastramento da solicitação de refúgio, o qual é enviado para decisão ao Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE), vinculado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, estando autorizada a residência provisória no Brasil até o julgamento final do pedido de refúgio (art. 96, §4º do Decreto nº 9.199/2017).

Nesse cenário, cabe à Polícia Federal no Espírito Santo apenas atender os migrantes no caso de renovação anual da solicitação de refúgio ou no caso de emissão da Carteira de Registro Nacional Migratório – CRNM quando deferida a solicitação de refúgio pelo CONARE.

Vale mencionar, entretanto, que a lei de 2018, impõe uma série de obrigações e responsabilidades aos entes federativos no que tange à adoção de medidas de assistência emergencial para acolhimento essas pessoas, para proteção social, atenção à saúde, observância dos direitos humanos etc.

Portanto, trata-se de questão complexa, cabendo agora aos serviços de assistência social darem o devido acolhimento aos venezuelanos”.

* Com informações da TV Vitória | RecordTV

Secretário de Teixeira de Freitas causa polêmica ao comentar sobre venezuelanos em Vitória. Marcelo Teixeira, titular da pasta de Assistência Social de Teixeira de Freitas, recebeu críticas nas redes sociais de internautas por não ter avisado à Prefeitura de Vitória sobre a chegada dos indígenas refugiados no Espírito Santo
Foto: Lucas Pisa

O secretário municipal de Assistência Social de Teixeira de Freitas, Marcelo Teixeira, causou polêmica ao comentar sobre o caso dos indígenas venezuelanos que foram deixados em Vitória nesta terça-feira (16).

Ele foi cobrado por internautas por não ter avisado previamente à Prefeitura de Vitória sobre a chegada dos refugiados. Nas críticas, os internautas avaliam que, se a gestão municipal da capital capixaba soubesse, teria preparado uma acolhida mais digna ao grupo de 25 pessoas da etnia Warao, que incluíam 13 crianças e um recém-nascido de apenas 8 dias. No final da tarde, eles foram conduzidos, pela Prefeitura de Vitória, a um abrigo no Centro Pop, em Santo Antônio.

Em uma rede social, Teixeira relatou todo o serviço prestado pela administração municipal da cidade baiana e negou que o grupo tenha sido abandonado pela prefeitura em Vitória. Falou que a assistência foi feita desde que o grupo desembarcou por lá, na sexta-feira (12), vindos de Jequié, outro município baiano.

“Imediatamente providenciamos um abrigo provisório numa escola municipal. Visto que não temos abrigo na cidade, não temos território indígenas, não temos políticas de povos indígenas porque não temos Ofertamos alimentação, serviços médicos e doações. Dignidade a esse povo não faltou”, declarou.

Relatou ainda que a decisão de viajar para a capital capixaba tinha sido dos próprios indígenas depois que, segundo o secretário, os refugiados concluíram que não teriam condições de viver em Teixeira de Freitas.

“Eles não foram jogados. Eles desembarcaram como pessoas adultas que são e assim como em Teixeira de Freitas eu acho que cabe ao município onde passarem acolherem com amor, com dignidade. Não essa campanha de difamação contra os políticos de Teixeira de Freitas porque não fizemos isso com a cidade de Jequié que deixou eles aqui em Teixeira de Freitas”, justifica.

Mas a explicação não convenceu. Alguns internautas foram no perfil do secretário e questionaram por que não houve uma comunicação com a Prefeitura de Vitória, avisando sobre a chegada dos refugiados. “Ótima a atitude da prefeitura, mas faltou detalhes para terminar legal”, apontou um internauta.

“Tenho umas questões: são pessoas adultas, mas pessoas adultas em vulnerabilidade não devem ter um melhor encaminhamento? Sabendo que, aqui em Vitória, não teriam para onde ir, ou sabiam a quem recorrer, o município de Teixeira de Freitas não poderia intervir e servir de ponte para essa comunicação? Os questionamentos não são a respeito de como foram tratados aí, mas sim com o ‘lavar de mãos’ com o que aconteceria aqui”, criticou outro.

“Falou bonito mas pecou em não fazer da forma como deveriam ter feito, ecaminhados, informando à prefeitura da cidade para que pudessem ser recebidos da melhor forma. A forma com que eles foram ‘abandonados’ na cidade é que é o problema”, destacou outro.

O secretário respondeu algumas dessas críticas em seu perfil e também em outros. Numa de suas respostas, disse que “Prefeitura nenhuma foi notificada da Venezuela até Teixeira de Freitas… A verdade é que Vitória não quer estrangeiro aí…”.

Em outro post, uma internauta diz: “Custava ligar para a prefeitura de Vitória para que a assistência municipal do município preparasse um local digno para acolher esse pessoal?”.

Rebatendo  a mais essa crítica sobre a falta de comunicação com Vitória, ele registra: “Ninguém me avisou e recebemos com dignidade… Será que a prefeitura de Vitória é menos capaz do que a de Teixeira???”.

O secretário, ao responder a um outro crítico que considerava que os venezuelanos foram abandonados pela prefeitura de Teixeira de Freitas, disse que tudo foi interpretado de forma exagerada.

“Nós fretamos um ônibus digno e honroso, eles embarcaram e desembarcaram com dignidade. O cacique tem celular, Whatsapp e disse que costuma sempre ficar em hotéis. Eles não foram largados lá… Eles são pessoas autônomas, eles queriam apenas ir embora daqui. Eles estão viajando da Venezuela e até aqui em Teixeira passou por dezenas de cidades e vários estados. Mas em Vitória criaram esse espetáculo sensacionalista”, postou.

Prefeitura de Teixeira de Freitas negou que indígenas foram abandonados

Por meio de nota, a prefeitura de Teixeira de Freitas reforçou que os indígenas venezuelanos não foram abandonados ao desembarcarem em Vitória nesta terça-feira (16).

“Foi noticiado que os imigrantes que passaram por Teixeira de Freitas desembarcaram na cidade de Vitória hoje (16) em situação de abandono causada pela PMTF.

Segundo Marcelo Teixeira, secretário de Assistência Social, os membros da comunidade indígena desembarcaram em Teixeira de Freitas na última sexta-feira (12), vindos de Jequié e antes disso já estavam em peregrinação por várias cidades e estados brasileiros. Ao encontrá-los, a Secretaria imediatamente providenciou um abrigo provisório na Escola Municipal Tarsila do Amaral. Foram oferecidas alimentação, doações e atendimento médico”, relata a nota.

A prefeitura disse que tentou contato com a Fundação Nacional do Índio (Funai), mas não houve apoio.

“Devido à ausência de comunidades indígenas em território teixeirense, não há o funcionamento de políticas públicas nem verba disponível que possam fornecer a assistência adequada a este grupo. Foi feito contato com a Funai, órgão federal responsável pelos indígenas, porém não houve sucesso em conseguir apoio. Apesar disso, todo acolhimento foi feito dentro das possibilidades do município”, explica.

Prossegue dizendo que ter o Espírito Santo como destino foi escolha do grupo de venezuelanos. “Alguns dias após a chegada do grupo, a administração pública atendeu o pedido dos venezuelanos e forneceu transporte para a região de escolha exclusiva deles, Vitória, no Espírito Santo”, destaca.

O que diz a Prefeitura de Vitória

A Prefeitura de Vitória foi surpreendida, na manhã desta terça-feira (16), com a notícia de que um grupo de venezuelanos havia sido deixado em uma área perto da Rodoviária da Capital.

Solidária à situação e cumprindo o que preconiza a Lei nº 13.684/2018, que dispõe sobre medidas de assistência emergencial para acolhimento a pessoas em situação de vulnerabilidade decorrente de fluxo migratório provocado por crise humanitária, a gestão, por meio da Secretaria Municipal de Assistência Social (Semas), encaminhou, logo no início da manhã, equipes de abordagem à região da rodoviária de Vitória.

A Semas realizou os primeiros atendimentos ao grupo, prestando assistência emergencial às principais necessidades do mesmo, e imediatamente começou a avaliar possíveis encaminhamentos para essas pessoas. A Secretaria Municipal de Saúde também prestou atendimento.

Concomitante a isso, a Guarda Municipal acompanhou as famílias, a fim de resguardar a integridade física e a segurança do grupo.

A Prefeitura de Vitoria enviou ofício relatando a situação à Policia Federal e está oficiando o Ministério da Cidadania, a Defensoria Pública da União, o Governo do Estado e o Ministério Público.

Ainda durante a tarde desta terça(16), as famílias foram encaminhadas para uma unidade da Prefeitura de Vitória, que segue buscando alternativas legais para o caso, capazes de resguardar os direitos e garantias fundamentais dos cidadãos em tese. Redação Folha Vitória