Empréstimo de obras de Frans Krajcberg causa surpresa e revolta

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Prefeita de Nova Viçosa diz que não foi formalmente avisada sobre retirada de acervo do artista polonês

Artista plástico polonês radicado na Bahia, Krajcberg elegeu Nova Viçosa para abrigar sua obra
Artista plástico polonês radicado na Bahia, Krajcberg elegeu Nova Viçosa para abrigar sua obra – 
Moradores de Nova Viçosa e admiradores da obra de Frans Krajcberg foram pegos de surpresa com a retirada repentina de peças do acervo do artista plástico polonês naturalizado brasileiro, que residiu no município. A coleção, que está armazenada no Sítio Natura, antiga casa e ateliê do artista na cidade, teve itens levados pelo Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (Ipac) na manhã deste domingo, 24.

De acordo com um decreto publicado na edição do sábado, 23, do Diário Oficial do Estado da Bahia, o governo estadual autorizou o empréstimo de 106 obras de Frans Krajcberg para compor a exposição “Frans Krajcberg: por uma arquitetura da natureza”, que será realizada no Museu Brasileiro de Escultura e Ecologia (MuBE), localizado no Jardim Europa, na cidade de São Paulo. Conforme o documento, a instalação vai ocorrer de 7 de maio a 7 de agosto de 2022.

As obras de Krajcberg pertencem ao governo da Bahia desde 2009, quando o artista doou seu acervo de 48 mil itens, entre eles, esculturas, gravuras, fotografias e pinturas, com o objetivo de preservá-los após a sua morte. Krajcberg, que faleceu em 2017, ficou conhecido por utilizar matéria-prima natural para seus trabalhos, a exemplo de troncos e raízes calcinados. Escultor, fotógrafo, gravador e pintor internacionalmente reconhecido, ele também era famoso por seu ativismo ambiental.

Informações preliminares apontam que, por volta das 6h, caminhões saíram do sítio carregados com o material. Em um dos vídeos divulgados pela população, um morador afirma que as obras tinham como destino o estado de São Paulo. No entanto, ele diz que as peças foram levadas sem qualquer autorização legal ou seguro próprio.

A vigência do empréstimo, que consta na decisão, vai de 22 de abril a 30 de agosto de 2022, e inclui “higienização, conservação e restauro das obras, quando necessário, montagem, exposição, desmontagem e transporte de retorno ao Museu do Recôncavo Wanderley Pinho (MRWP) situado em Caboto, Candeias”. A ordem foi assinada pelo diretor geral do Ipac, João Carlos Cruz de Oliveira.

Indignação

A prefeita de Nova Viçosa, Luciana Rodrigues (PP), protestou contra a retirada das obras, em vídeo publicado no seu perfil do Instagram, neste domingo. Ela manifestou indignação e disse que, embora tenha sido avisada da possibilidade anteriormente, decidiu acionar o setor jurídico da prefeitura para questionar a ação do governo do estado e o porquê do órgão não ter sido comunicado formalmente.

“Isso me deixou muito triste e preocupada porque no dia 17 de abril, eu tive uma reunião com João Carlos, presidente do Ipac, e ele realmente falou que tinha intenção em tirar as obras do museu e levar para um museu em São Paulo. Eu deixei bem claro que era contra, que a minha posição de prefeita era contra essa atitude. Porque não fazia investimentos no museu?”, questionou ela.

A prefeita defende a criação de um museu em Nova Viçosa, a fim de fomentar o turismo cultural. Ela afirmou ainda que já propôs ao Estado uma parceria com a prefeitura para a gestão do equipamento cultural.

“Sabe como Krajcberg é conhecido na França? Como o homem que morava na árvore, na casa da árvore. Você sabia que a casa da árvore está comprometida?”, diz. “Krajcberg escolheu Nova Viçosa para morar, então estão querendo tirar a nossa história”, reclama.

Nos comentários da publicação, muitos moradores manifestaram apoio a fala da prefeita e pediram o retorno das obras à cidade. Um dos mais preocupados com a retirada do material é o artista plástico Henrique Falcão, que teme que o acervo não seja devolvido.

“Eu acho um absurdo. Primeiro a falta de respeito com um homem dono de um trabalho como o dele. É um crime, uma vergonha, para classe artística, então…Ele é o maior representante aqui da região. Retirar isso do seu berço de cultura, um lugar que ele quis que deixasse, é algo lamentável. É inaceitável”, declara.

A equipe de reportagem do Portal A TARDE tentou contato com o Ipac para saber sobre a autorização da retirada das obras junto a Prefeitura de Nova Viçosa, e confirmar o retorno do acervo para o município, mas não obteve retorno até a publicação da matéria. Por Bianca Carneiro / A Tarde

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Polonês radicado na Bahia, Krajcberg elegeu Nova Viçosa para abrigar obra. (Divulgação)

O tão esperado museu de Frans Krajcberg que seria erguido no sítio onde ele viveu, em Nova Viçosa, no extremo sul da Bahia, não vai acontecer. Embora o artista tenha feito a doação do seu acervo ao governo do estado com este objetivo, a equipe técnica do Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (IPAC) avaliou que o Sítio Natura não é adequado para abrigar as obras do artista e dará outro destino a área. “Além do alto custo de manutenção  para manter as obras lá, teríamos pouco retorno de público, então vamos sim preservar o sítio e a história do artista lá, mas sob a ótica da preservação ambiental, que norteou a carreira dele”, diz João Carlos Oliveira, diretor do IPAC.

Casa onde Krajcberg morou em Nova Viçosa, na Bahia. (Divulgação)

Parcerias 
A ideia do Governo do Estado é fazer parcerias com instituições, como o Projeto Tamar, já que o sítio está numa área de desova de tartarugas marinhas, de passagem de baleias, e criar ali um espaço de preservação ecológica que conte a história do artista. “Ali é um espaço agressivo para o tipo de obra que Krjacberg fazia, com troncos de árvores mortos, queimados, então não tem como manter essas obras lá com segurança”, diz João Carlos.

Obras do artista Frans Krajcberg foram doadas ao Estado da Bahia. (Divulgação)

Mostra itinerante
Sobre o acervo de Krajcberg que está em poder do Estado, João Carlos Oliveira diz que este vai percorrer o Brasil e o mundo, durante quatro anos, numa exposição itinerante. “Até a volta do acervo à Bahia, o governo do estado já terá definido onde as obras ficarão, provavelmente será na Região Metropolitana de Salvador”, diz o diretor do IPAC, que nomeou o arquiteto Robson Takeo Shishido para fiscalizar o contrato com a empresa encarregada de fazer os serviços de levantamento topográfico e planialtimétrico cadastral do Sítio Natura. Por Ronaldo Jacobina / Correio24horas.

Nota da Redação: Esta última máteria foi publicada em 2019 pelo Correio24horas