Reunião em Brasília busca ampliar comércio bilateral e consolidar Brasil como parceiro estratégico diante das sanções tarifárias impostas por Washington

247 – Em meio à intensificação da guerra comercial entre Estados Unidos e China, autoridades de alto escalão do setor agrícola do Brasil e da China se reúnem nesta semana em Brasília para discutir a ampliação das exportações brasileiras ao mercado chinês. A informação foi divulgada originalmente pelo South China Morning Post, que destacou o caráter estratégico do encontro diante da política tarifária adotada pelo governo do presidente norte-americano Donald Trump contra Pequim.
As reuniões, marcadas para quinta e sexta-feira, contarão com a presença do ministro da Agricultura brasileiro, Carlos Fávaro, e do vice-ministro da Agricultura e Assuntos Rurais da China, Zhang Zhili, além de outras autoridades dos dois países. Entre os principais temas da pauta estão o aumento das exportações de soja e carne brasileiras, a reabilitação de frigoríficos suspensos por questões sanitárias e o fortalecimento da produção agrícola nacional para atender à crescente demanda chinesa.
“O Brasil precisa reafirmar seu papel como parceiro estável, especialmente diante do confronto tarifário entre China e EUA”, afirmou Larissa Wachholz, ex-assessora do Ministério da Agricultura para assuntos chineses e pesquisadora do Centro Brasileiro de Relações Internacionais.
O encontro acontece em um contexto de escalada nas tensões comerciais. Na última terça-feira, Donald Trump utilizou sua conta na Truth Social para manifestar apoio aos agricultores americanos, impactados pelas sanções chinesas. “Nossos agricultores são GRANDES, mas por causa de sua GRANDEZA, eles sempre são colocados na linha de frente contra adversários como a China”, escreveu o ex-presidente.
Em resposta, na sexta-feira anterior, Pequim anunciou um aumento expressivo nas tarifas sobre produtos norte-americanos, que podem chegar a até 125%. Em nota oficial, o governo chinês classificou a estratégia de Washington como “uma piada”.
Diante desse cenário, o Brasil tem se beneficiado como principal fornecedor alternativo de alimentos à China. No entanto, Wachholz alerta para a necessidade de planejamento estratégico a longo prazo. “A agricultura pode virar moeda de troca. Soja e carne são setores em que Brasil e EUA competem diretamente nas exportações para a China. Se Pequim for pressionada a comprar mais dos EUA, o Brasil pode perder mercado”, destacou.
Além dos assuntos comerciais, a delegação chinesa também discutirá sua participação nos grupos de trabalho do Brics — bloco formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. O Brasil sediará a próxima cúpula do grupo em julho, no Rio de Janeiro, e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve visitar a China em maio para o Fórum China-CELAC.
A agenda bilateral inclui ainda debates sobre o novo plano decenal de desenvolvimento agrícola da China, que visa garantir a segurança alimentar do país até 2035. O plano prevê aumento da inovação tecnológica, produtividade no campo e estímulo à produção interna de grãos e carne — aspectos que preocupam Brasília quanto ao futuro das exportações brasileiras.
“O Brasil quer entender como se alinhar ao plano agregando valor aos seus grãos exportados”, afirmou um representante do governo brasileiro. A ideia é fomentar o processamento interno de soja e milho antes do envio ao exterior, agregando valor aos produtos exportados.
Também foram propostos avanços na cooperação técnica entre os países, com destaque para pesquisas conjuntas em áreas como inteligência artificial, biotecnologia e agricultura digital.
Apesar do otimismo com as possibilidades de avanço, os gargalos logísticos continuam sendo um obstáculo. O Brasil enfrenta um déficit estimado de 120 milhões de toneladas em capacidade de armazenamento de grãos, o que compromete sua competitividade. Para Larissa Wachholz, investimentos chineses podem ser cruciais nesse ponto.
“Esses são projetos caros e de longo prazo. A China tem capital paciente e interesse estratégico. Expandir o investimento em armazenamento e logística pode fortalecer o comércio e proteger o Brasil de choques futuros”, concluiu.
O momento é considerado uma oportunidade única para o Brasil se consolidar como um parceiro confiável da China em um cenário global marcado por reposicionamentos estratégicos e pelo protecionismo crescente dos Estados Unidos.