Por Luiz Flávio Gomes*
O Supremo Tribunal Federal nunca examinou esse tema, mas é bastante provável e totalmente previsível que sua resposta será no sentido positivo.
Ter a condição de réu (como é o caso hoje do Lula e do Bolsonaro, por exemplo), dirá o STF, não é causa impeditiva para que o eleito tome posse no cargo de presidente da República.
É evidente que isso não é ético, mas juridicamente é possível que aconteça. Por quê?
Em 2016 eu e Márlon Reis sustentamos a tese de que quem é réu não pode presidir nenhum dos cargos que estão na linha substitutiva do Presidente da República (Presidente da Câmara dos Deputados, do Senado e do STF).
Toda essa polêmica ganhou relevância ímpar porque Renan Calheiros se tornou réu perante a Corte Máxima. Nós sustentávamos que essa condição impedia o exercício da presidência do Senado.
O STF julgou o assunto na ADPF 402 (no final de 2016) e decidiu o seguinte: quem é réu não pode substituir o presidente da República, mas pode ser presidente do Senado, da Câmara ou do STF.
De acordo com a interpretação restritiva da Corte, Renan não perdeu a presidência do Senado, mesmo sendo réu em processo penal (em razão do recebimento de propina da Mendes Júnior para pagar pensão para sua filha).
Nas cleptocracias, sempre que possível as Cortes Supremas, sobretudo quando indicadas politicamente, procuram preservar nos seus postos os donos do poder, ainda quando acusados de brutal corrupção. Trata-se da função protetiva do status quo. Os donos corruptos do poder raramente são eliminados do jogo sujo da corrupção pelas Cortes Superiores do Judiciário.
No que diz respeito ao cargo de presidente da República, antes do julgamento do STF contra Renan, cheguei a imaginar que nenhum réu tomaria posse como presidente da República no Brasil. Nosso raciocínio: se réu não pode ser presidente tampouco pode tomar posse no mesmo cargo.
Mas certamente não será esse o pensamento da Corte Suprema, que dirá o seguinte: o presidente da República somente pode ser afastado de suas funções quando a acusação contra ele é admitida pela Câmara dos Deputados (CF, art. 86).
Em processos precedentes contra candidatos a presidente da República não existe essa exigência da intervenção da Câmara dos Deputados. Sem esse filtro da Câmara, não há como impedir o exercício do posto máximo do país.
Em relação aos crimes anteriores ao exercício da função, ademais, vigora o § 4º do mesmo artigo 86, que diz: “O Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções”. Este dispositivo não impede a posse do presidente. Ao contrário, lhe confere uma imunidade.
Em outras palavras: o presidente conta com um tipo de imunidade processual que não permite sua responsabilidade por atos anteriores ou estranhos às funções. Consequentemente, o réu que assume a presidência da República terá seus processos (anteriores ao exercício do cargo) suspensos, impondo-se também a suspensão da prescrição.
Conclusão: candidato a presidente da República que é réu em processo criminal, se não alcançado pela Lei da Ficha Limpa, não está impedido de se candidatar nem está vedado para tomar posse no cargo mais importante na nação.
Do ponto de vista jurídico certamente é isso que dirá o STF quando for provocado sobre a matéria. Nem mesmo réus acusados de corrupção, racismo, apologia a crimes sexuais ou outro crime grave deixará de tomar posse como Presidente do Brasil por esse motivo.
Com isso se vê o quanto o Direito, muitas vezes, está longe da Ética e da Moral. Esse distanciamento em cleptocracias que padecem de corrupção sistêmica leva sempre o país ao fracasso. Sem ensinamento diário da Ética o Brasil não terá destino diferente.
*Luiz Flávio Gomes, jurista e criador do movimento Quero Um Brasil Ético. Estou no f/luizflaviogomesoficial