Brasil avança em missão à Antártica com pegada zero de carbono e revela impacto das queimadas amazônicas no degelo polar

3

Expedição brasileira inaugura modelo internacional de compensação total de carbono

Queimadas amazônicas contribuem para o degelo polar (Foto: Wikimedia Commons)

247 – A próxima missão científica brasileira à Antártica será a primeira do mundo planejada para compensar integralmente suas emissões de carbono. Ao mesmo tempo, novos dados divulgados pela Missão Criosfera1 reforçam a conexão direta entre queimadas na Amazônia e o acelerado derretimento das geleiras antárticas.

A iniciativa é coordenada pelo professor Heitor Evangelista da Silva, da UERJ, e conta com participação decisiva da empresa Ambipar, responsável pela certificação internacional Carbon Free e pelo suporte técnico nas ações de mensuração, mitigação e compensação das emissões. O projeto também envolve a ABNT e segue os padrões do Protocolo GHG.

Fuligem amazônica acelera o derretimento das geleiras

Pesquisa publicada na revista Science Advances — e destacada pela Missão Criosfera1 — demonstra que partículas de carbono negro produzidas por queimadas na Amazônia percorrem milhares de quilômetros até chegar à Península Antártica.

Segundo o estudo,“a fuligem das queimadas na Amazônia contribui para o derretimento das geleiras na Península Antártica, distante milhares de quilômetros.”

As partículas escuras, ao se depositarem sobre o gelo, reduzem o albedo, diminuindo a capacidade de reflexão da luz solar. Como resultado, a superfície absorve mais calor e derrete mais rapidamente. A equipe ressalta que este é um dos mecanismos mais subestimados da conexão entre a Amazônia e os ecossistemas polares.

Além disso, a pesquisa aponta que embarcações turísticas que circulam pela região respondem por cerca de metade da fuligem depositada no continente gelado, ampliando ainda mais os impactos climáticos.

Logística da missão e o papel da Ambipar

A missão brasileira, prevista para ocorrer entre o fim de 2025 e o início de 2026, enviará quatro pesquisadores ao laboratório Criosfera 1. Toda a operação logística — envolvendo aviões comerciais, cargueiros, navio polar da Marinha e trator de neve — foi detalhadamente avaliada em termos de emissões.

A ABNT estimou cerca de 9 toneladas de CO₂ equivalente, que serão compensadas integralmente com apoio técnico e certificação da Ambipar, líder em gestão ambiental no Brasil. A empresa atuou na modelagem do inventário de emissões, na validação das métricas e na certificação final de pegada zero, consolidando-se como parceira central do processo.

As emissões foram calculadas segundo o Padrão Corporativo do Protocolo GHG, Escopos 1 e 3, com registros na plataforma pública GHG Protocol Tool.

Reflorestamento para neutralizar a pegada ambiental

Com base nos cálculos de emissões, a missão adotará estratégia robusta de compensação: o plantio de 200 árvores nativas da Mata Atlântica, em parceria com a Reserva Ecológica de Guapiaçu (REGUA). A ação envolverá comunidades locais e estudantes universitários, ampliando o impacto social do projeto.

A prática, chamada de “captura equivalente de carbono”, está alinhada ao Plano Estratégico Plurianual do Acordo da Antártica, ao Plano Quinquenal do Conselho Estadual do Meio Ambiente e aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, especialmente o ODS 13.

Integrantes da primeira missão carbono zero na Antártica
Integrantes da primeira missão carbono zero na Antártica(Photo: Divulgação)Divulgação

Conexão Amazônia–Antártica: impactos globais

Os dados da Missão Criosfera1 reforçam que a relação entre a Amazônia e a Antártica é direta e profunda. Partículas liberadas por queimadas chegam à alta atmosfera, são transportadas por correntes de ar e acabam se depositando sobre o gelo antártico.

A redução do albedo acelera o degelo, com repercussões globais para o clima, para a elevação do nível do mar e para padrões meteorológicos. A constatação reforça a urgência de políticas rigorosas contra desmatamento e queimadas, cujos impactos extrapolam fronteiras nacionais.

O impacto crescente do turismo na Antártica

A pesquisa divulgada pela Missão Criosfera1 também alerta para o papel das embarcações turísticas. Segundo os dados, navios de cruzeiro que operam na região respondem por cerca de 50% das partículas de fuligem detectadas na península.

O crescimento exponencial do turismo polar — impulsionado pela busca por “experiências extremas” — preocupa cientistas. Caso o ritmo atual seja mantido, áreas inteiras da Antártica poderão atingir pontos irreversíveis de perda de gelo.

A equipe da Missão Criosfera1

A expedição reúne especialistas de múltiplas áreas. Além do coordenador Heitor Evangelista, integram o grupo:

  •  Heber Reis Passos – técnico de laboratório eletrônico sênior
  •  Franco Nadal Junqueira Villela – meteorologista do INMET
  •  Prof. Cesar Rogério Leal do Amaral – docente do Departamento de Biofísica
  •  João Paulo Santos Barbosa – fotógrafo profissional
  •  Gabriel Estevam Domingos – engenheiro ambiental

O suporte técnico-científico e administrativo inclui:

  •  Prof. André Luís de Sá Salomão – biólogo
  •  Andreia Mendonça de Oliveira – bióloga
  •  Pedro Zöhrer Rodrigues da Costa – designer e professor
  •  Marcelo Sampaio – engenheiro elétrico
  •  Felipe Alvares – engenheiro de controle e automação

Criosfera 1: a base científica brasileira mais remota

Instalado em 2011/2012 e resultado de três décadas de pesquisa, o laboratório Criosfera 1 é uma das raras plataformas científicas completamente automatizadas no interior da Antártica. Localiza-se a 2.500 km da Estação Comandante Ferraz e a 600 km do Polo Sul.

A base monitora:

  •  CO₂ atmosférico
  •  carbono negro
  •  ozônio de superfície
  •  radiação cósmica (muons)
  •  radiações UV-A e UV-B
  •  meteorologia local
  •  acúmulo de neve em tempo real

Durante o verão, a energia vem de painéis solares; no inverno, de mini geradores eólicos. Os dados são transmitidos via sistema ARGOS e processados pela UERJ e pelo INMET.

Ciência brasileira no centro do debate climático

A integração entre mitigação ambiental, pesquisa de ponta e políticas de compensação torna a Missão Criosfera1 uma referência internacional. Ao iluminar conexões entre queimadas amazônicas, turismo antártico e degelo polar — e ao estruturar a primeira missão científica de pegada zero — o Brasil se consolida como protagonista das pesquisas climáticas globais.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

Moderação de comentário está ativada. Seu comentário pode demorar algum tempo para aparecer.