Alcobaça – O seu nome é praia

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Se o turista desnorteado – o que costuma ser pleonasmo – indagar a qualquer morador de Alcobaça onde é a praia, receberá como resposta: “é logo ali, ó”, com uma breve esticada de canto de boca. Nem se dá ao esforço de levantar o braço. De fato, o espaço urbano de Alcobaça, visto de cima, de lado ou de qualquer perspectiva, abriga quase todos seus habitantes a menos de 400 metros da praia. Lá, ser vizinho da praia é tão comum que os nativos já nem se tocam com esse fantástico privilégio. Seu nome merecia ser “Praia de Alcobaça”.  A mineirada quando aporta por lá, põe a mão na testa, mira o horizonte infinito, vira para o sul, depois para o norte e lança sua máxima: “ô praião besta, sô”! Uns, ato reflexo, se curvam em reverência à natureza, ali toda exposta e disposta sem disfarce; outros até se ajoelham na areia em prece deixando-se molhar por inteiro, como em liturgia batismal, ainda com a roupa de viagem. É quase certo afirmar que não existe ninguém no mundo que mais goste de praia que o mineiro. É por isso que ele ama de paixão Alcobaça. É ele a principal animação da cidade, que entra alegremente no mar com chuva e vento frio, que consegue se orgulhar de ter descoberto onde a cerveja é mais barata, que chama o amigo para hospedá-lo em casa mesmo que esta seja humilde e já esteja super lotada, só para ter o prazer de exibir-lhe o praião de Alcobaça, ou melhor, dele! Não deixa por menos.

A moçada de Teixeira de Freitas compartilha essa propriedade pacificamente com os mineiros e vai mais longe, faz de Alcobaça o que os paulistanos fazem do Guarujá. Deu folga, o nariz já aponta para o leste, fareja rapidinho o cheiro do mar, de Alcobaça, é claro. É hora de calçar chinelos, vestir camiseta, colocar óculos escuros, descer a serra e bater ponto na “terra do oi”: oi Rodrigo, oi Claudinha, oi seu Geraldo, oi Frei Paulo, oi doutor, oi professora. É o que se ouve no “footing” do calçadão da orla. Lá, quase todos se conhecem e aproveitam a ocasião para aprofundar amizades; muitos ficam íntimos, de repente. No fundo os teixeirenses consideram Alcobaça como o gracioso pedaço costeiro da “Grande Teixeira”. Muita gente tem casa ou pelo menos um canto por lá, para se encostar.

Aos alcobacenses, com tanta corte a seus pés, resta sorrir orgulhosamente de sua magnífica praia, de seus mais de dez quilômetros de areia dourada contornados por coqueiros sempre a balançar suas palhas em ato de boas vindas, da constante e generosa brisa nordeste, da familiaridade que reveste os afagos com os visitantes, de estar sempre de braços abertos e rosto descontraído para expor toda sua simpatia e fraternidade.

Os alcobacenses são tão íntimos da praia que conhecem os grauçás pelo nome e apelido de cada um. Maré alta e maré baixa, lua cheia, lua nova, conseguem prever com a precisão de segundos. Tem uma coisa que só suportam no sacrifício, não gostam de modo algum: é o chamado vento sul, aquele que trás chuva, frio, sujeira para a praia e tristeza à população. É tempo de ir à igreja matriz fazer preces a São Bernardo.

Mas, tudo isso passa com um belo sedativo para amortecer a penitência do terrível vento sul, é curtir a paisagem no estuário do rio Itanhém. Não são raros cardumes de golfinhos acompanhando barcos pesqueiros, tainhas em concurso de salto à distância, gaivotas em divertida arrelia disputando um agrado do pescador. Tímidos raios de sol matizando a calma água doce que se contrapõe às elevadas vagas vistas ao longo da barra. Não há visitantes! Parece vazio. Há silêncio, mas, não há tristeza. Melhor que deixem esse tipo de curtição aos nativos, capazes de sentir beleza e harmonia em Alcobaça mesmo no inverno.

Alcobaça, simples, em seu jeito humilde, sem os pretensiosos arroubos de cidade grande, reconhece que o destino lhe fez donzela bela, formosa e concessiva sempre em trejeitos acanhados, mas, sorriso franco para agradar seus visitantes, principalmente os que querem ser seu dono, nem que seja por uma breve temporada.

*Roberio Sulz é professor universitário; biólogo, biomédico (B.Sc.) pela UnB; M.Sc. pela Universidade de Wisconsin, EEUU. [email protected]