A visita da Ministra Eliana Calmon

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O poeta francês Paul Verlaine disse que: “não existe noite, por mais tenebrosa que seja, que nunca tenha uma aurora”. Sempre vivemos de esperanças, pois o mundo sofre uma dicotomia, dualidade, permanente. Tudo se resume em duas faces: alto baixo, claro escuro, masculino e feminino. Esta semana tomamos conhecimento do falecimento do Desembargador Gerson Pereira, o jornal A Tarde noticiou como sendo o primeiro negro a presidir o Tribunal de Justiça da Bahia, para no dia seguinte retificar a notícia lembrando que foi Manuel Pereira. Dr. Gerson era muito meu amigo. De uma simplicidade franciscana. Muitas vezes me recebia em sua residência vestido apenas com o pijama. Ao contrário do Desembargador, depois Ministro do Tribunal Federal de Recurso, Amarildo Benjamim, que antes de nos receber, Alcides Palmas, Heider Barbosa Coelho e eu, fazia a barba, colocava a gravata, descia para num ratocismo sem explicação chamar Arcides, principarmente, gerarmente. Foi meu Professor de Teoria Geral do Estado, antes de ir para Brasília. Graças ao meu relacionamento com Dr. Gerson, foi que conseguimos instalar a comarca de Teixeira de Freitas. Dr. Manuel Pereira, também meu amigo, foi quem veio instalar. Fui o orador que o saudou e também quem o homenageou com o nome do Fórum, que ele, ao chegar, sussurrou ao meu ouvido que estava grafado erroneamente com “O” e não com “U”. Acompanhei Dr. Gerson pelas inaugurações de outras comarcas, tais como Guaratinga, Itagimirim, onde o prefeito não aceitou a ingerência de adversários políticos pelo evento, mandando desligar a energia, cuja inauguração ocorreu com luz de velas. Temóteo Alves de Brito, então prefeito da cidade, tudo fez para a emancipação jurídica dela, inclusive trazendo uma comitiva de 17 desembargadores para prestigiar o ato da outorga do Título de Cidadão de Teixeira de Freitas ao Dr. Gerson Pereira. Foi uma consagração. Dr. Gerson dizia que eu era o verdadeiro Embaixador do Extremo Sul. Tenho seus livros autografados com este codinome. Voltando ao fato da dicotomia. Estamos tristes com o passamento de Dr. Gerson Pereira com relevantes serviços prestados, não só ao Judiciário da Bahia, mas ao ensino superior. Mas a aurora de Verlaine se aproxima com a prevista chegada da Ministra Eliana Calmon, em uma visita inédita, que muito honra a pequena Teixeira de Freitas. Todos conhecemos o vigor com que ela defende a ética e a moral em todos os campos sociais. Ruy Barbosa certa feita asseverou que: “Há tantos burros mandando em homens de inteligência, que, às vezes, fico pensando que a burrice é uma ciência”. Esta frase poderia ser atribuída à Ministra Eliana Calmon trocando a palavra burrice por corrupção. No momento atual, caberia muito bem. Graças ao seu destemor dois Presidentes do Tribunal de Justiça da Bahia se encontram afastados. De família tradicional baiana, com uma cidade com o nome de Miguel Calmon, tive contatos com muito seus colegas da Justiça Federal da Bahia, no Edifício onde hoje funciona a Ordem dos Advogados da Bahia, na entrada da av. Joana Angélica, que antes foi a Faculdade de Direito, onde em 1957 conheci Pedro Calmon. Dentre outros me lembro de Lázaro Guimarães, que mantinha uma coluna no jornal A Tarde falando de Justiça.  Fernando Tourinho, Ax Tourinho, Aloisio Palmeira, meu colega de pensionato, tão meu amigo como Hugo Gomes de Almeida, este amigo pessoal, que teve a sua primeira investidura na comarca de Prado como Promotor de Justiça, que depois fez concurso para Juiz Estadual, aprovado não tomou posse. Concorreu para Juiz Federal, onde mais uma vez foi aprovado e não tomou posse. Obcecado por títulos, finalmente concorreu ao cargo de Procurador Federal, onde se aposentou. Dr. Antonio Exequiel, também Procurador Federal que trocou para juiz, ocupando uma vaga no Tribunal Regional Eleitoral da Bahia. Ainda outro dia, encontrei-me com ele na Justiça Federal de Ilhéus. E tantos outros que a pátina do tempo obliterou na memória. Em toda parte do mundo civilizado, a exceção é a regra, porém, no Brasil, este axioma é invertido, pois aqui a regra é que se torna exceção. A Ministra Eliana Calmon começou a acendrar a Justiça com denúncias de comportamentos inadequados de alguns de seus membros. Buliu com a caixa-preta, onde existem apenas inotocáveis. Tal atitude desagradou a muitos, tendo inclusive sido repreendida agressiva e deseducamente pelo então Presidente do Conselho Nacional de Justiça. O tempo se encarregou de provar os fatos e as suas denúncias. Nestes mais de 50 anos de exercício, como auxiliar da justiça, como consagra a CF aos advogados, jamais constatei um Tribunal da Bahia tão inexpressivo, sem menção em revistas especializadas de alguém dali oriundo, salvo com raríssimas exceções, como o Des. Paulo Furtado, membro da Revista Forense. Por algum tempo foi considerado o pior Tribunal de Justiça da Brasil. Melhorou, agora é o penúltimo. Seja bem-vinda, Ministra. Teixeira de Freitas, 12 de março de 2014.

*Ary Moreira Lisboa é advogado e escritor.