A Síndrome do Impostor e a angústia de nunca estarmos à altura

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Por Thales Aguiar*
Caros leitores, percebo um tremor na base da nossa autoestima coletiva. Não é algo que se fala abertamente, mas sussurrado em corredores de escritórios, em salas de aula pós-prova e nos pensamentos que insistem em vir à tona às três da manhã. É a sensação generalizada de que, a qualquer momento, alguém vai apontar o dedo e gritar: “Fraude!”. Vivemos a era da Síndrome do Impostor Coletiva. A síndrome do impostor, aquela vozinha interna que te convence de que seu sucesso é um golpe de sorte e que você não merece estar onde está, saiu do divã do analista e contaminou o espírito do nosso tempo. Virou um mal-estar social. Olhamos para a velocidade das mudanças tecnológicas, para a complexidade dos problemas globais e para os currículos impecáveis que desfilam nas nossas telas, e a conclusão secreta que muitos tiram é: “Eu não dou conta. E todo mundo, menos eu, parece ter recebido o manual de instruções da vida adulta no século XXI”.
Do ponto de vista da ciência política e social, isso não é uma mera coincidência. Nós desmantelamos as estruturas tradicionais de autoridade e conhecimento. Antes, tínhamos figuras claras, como o professor, o padre, o especialista, que mostravam um caminho a seguir. Hoje, com o conhecimento sendo produzido e desatualizado numa velocidade estonteante, a autoridade se fragmentou. O acesso à informação é ilimitado, mas a sabedoria para filtrá-la se tornou um bem escasso. O resultado? Uma angústia da desatualização permanente. A sensação de que, no momento em que você finalmente aprende uma nova ferramenta ou conceito, ele já se tornou obsoleto.
As redes sociais, mais uma vez, são o palco onde essa peça de insegurança é encenada. Elas nos mostram o produto final, polido e brilhante, da vida dos outros. Vemos o sucesso alheio, a viagem perfeita, a promoção reluzente, mas não vemos as dúvidas, os tropeços e as horas de estudo na solidão do quarto. Essa comparação distorcida é o combustível da síndrome do impostor. Criamos uma expectativa de competência onisciente e onipresente que é simplesmente impossível de ser alcançada por qualquer ser humano.
O preço que pagamos por isso é uma paralisia por análise. O medo de errar, de não estar à altura, nos impede de começar projetos novos, de assumir riscos e, principalmente, de compartilhar nossas vulnerabilidades. Fingimos que estamos no controle, enquanto por dentro nos sentimos como crianças que conseguiram se infiltrar em uma reunião de diretoria. Combater essa epidemia silenciosa exige uma mudança de chave. Precisamos substituir o mito do “gênio solitário” que nasce sabendo, pela cultura do “aprendiz permanente”, que não tem vergonha de não saber, de perguntar e de recalibrar sua rota. A verdadeira competência do nosso tempo não é saber tudo, mas ter a resiliência e a humildade para aprender sempre.
Desmontar a síndrome do impostor coletiva começa com uma conversa honesta. Precisamos normalizar o “não sei” e celebrar o “estou aprendendo”. Só quando baixarmos as armas da autocrítica excessiva e admitirmos que navegamos em águas desconhecidas juntos, é que essa angústia coletiva começará a se dissipar. No fim, o antídoto para se sentir uma fraude é perceber que todo mundo, em algum nível, também está se sentindo assim. E é justamente nessa vulnerabilidade compartilhada que reside a nossa verdadeira força.
*Thales Aguiar é Jornalista, Escritor e Especialista em Ciência Política.

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