Na censura o que predomina é o advérbio de negação. A bíblia o usa com muita insistência. A humanidade sempre viveu sob o jugo da censura. A primeira palavra que se aprende é NÃO. Não faça isso. Não ponha o dedo na boca. Não fale com a boca cheia. Não mastigue com a boca aberta. Não minta. Tudo isso era antigamente. Como tudo, os tempos por não serem inexoráveis, também sofrem mutações, inclusive de costumes, educação, modo de viver, de agir, de vestir. A censura sempre existiu, desde os tempos primitivos. Todo aquele dotado do mínimo senso de observação haverá de lembrar-se de épocas pretéritas. Agora está em moda o uso da cibernética, da virtualidade. Com o advento da internet, o mundo se tornou nanico, se apequenou em extensão. Basta um simples toque de uma tecla para o mundo entrar pelas salas mais distantes. Alguns países de radical religiosidade não permitem que as mulheres estudem, frequentem escolas. Em se tratando de governos totalitários, a censura beira as raias da imbecilidade, pois a intolerância não permite que pensamentos contrários enfrentem os mandantes. É do conhecimento de todos a Alemanha de Hitler, a China de Mao, a Rússia de Lenine e Stalin, a Cuba dos Castro, o Camboja de Pol Pot, mandando todos os intelectuais para o campo, ou a Coreia do Norte com o corte do cabelo do Ditador atual. Agora é a vez do Brasil na era PT. O Brasil que tanto já sofreu com ditaduras terríveis começa a sentir a aproximação dos tentáculos e das longas fauces da estrela vermelha. No período do Estado Novo com Getúlio Vargas, depois da vergonhosa covardia do governo brasileiro contra os fanáticos de Antonio Conselheiro, no final do século (comentários dispensados depois de Euclides da Cunha), surgiu o terror dos cangaceiros, com o mais famoso deles: Virgulino Ferreira, o Lampião. Ele fez amizade com o libanês Benjamin Abrahão, que o consagrou e divulgou através de fotos suas e de seus bandoleiros. Usando uma rudimentar máquina de filmar, chegou a fazer um filme que pretendia vender para o exterior. O governo receoso da imagem negativa do Brasil na Europa atacou com todos os meios possíveis e impossíveis para impedir sua divulgação. O grande e talentoso historiador Frederico Pernambucano de Mello, no livro Benjamim Abrahão, Entre Anjos e Cangaceiros, transcreve uma ordem para apreensão do filme e a proibição de sua exibição, nos seguintes termos: “Secretário de Segurança do Estado do Ceará – Fortaleza. Tendo chegado ao conhecimento do Departamento Nacional de Propaganda estar sendo anunciado, ou exibido na capital ou cidades do interior desse estado, um filme sobre Lampião, de propriedade da Aba-Film, com sede na rua Major Facundo, solicito vos digneis providenciar no sentido de ser apreendido imediatamente o referido filme, com todas as cópias, e respectivo negativo, e remetê-los a esta Repartição, devendo ser evitado seja o mesmo negociado com terceiros e enviado para fora do país. Atenciosos cumprimentos. Lourival Fontes, Diretor do Departamento Nacional de Propaganda do Ministério da Justiça”. O telegrama de Ruy Mesquita ao Ministro da Justiça Alfredo Buzaid; “Sr. Ministro: Da Polícia Federal recebemos o seguinte Aviso: “Da ordem do Senhor Ministro da Justiça fica expressamente proibida a publicidade de: Notícias, comentários, entrevistas ou critérios de qualquer natureza abertura política ou democratização ou assuntos correlatos, anistia a cassados ou revisão parcial de seus processos, críticas ou comentários ou editoriais desfavoráveis sobre situação econômico-financeira, ou problema sucessório e suas implicações. As ordens acima transmitidas atingem quaisquer pessoas, inclusive as que já foram ministro de estado ou ocuparam altas posições ou funções em quaisquer atividades públicas. Fica igualmente proibida pelo Ministro da Justiça a entrevista de Roberto Campos”. Fim. Senhor Ministro, ao tomar conhecimento dessas ordens emanadas de V. S. o meu sentimento foi de profunda humilhação e vergonha. Senti Vergonha, senhor Ministro, pelo Brasil, degradado à condição de uma Republiqueta de banana ou de uma Uganda qualquer, por um governo que acaba de perder a compostura. Parece incrível que os que decretam hoje o ostracismo forçado dos próprios companheiros de Revolução que ocuparam ontem os cargos em que se encontram hoje, não cogitem cinco minutos do julgamento da história. O Senhor, Senhor Ministro, deixará de sê-lo um dia. Todos os que estão hoje no poder, dele baixarão um dia e então, Sr. Ministro, como aconteceu na Alemanha de Hitler, na Itália de Mussolini, ou na Rússia de Stalin, o Brasil ficará sabendo a verdadeira história deste período em que a Revolução de 64 abandonou os rumos traçados pelo seu major líder, o Marechal Castelo Branco, para enveredar pelos rumos de um caudilhismo militar, que já está fora de moda, inclusive, nas repúblicas hispano-americanas. Cheio de vergonha por ver meu pais degradado a essa condição, subscrevo-me humilhado. Ruy Mesquita, Diretor do Jornal da Tarde e do Estado de São Paulo.19.09.1972”. Guardo o original. A história se repete.
Teixeira de Freitas, 08 de maio de 2014. *Ary Moreira Lisboa é advogado e escritor.