A futilidade da defesa de Trump a Bolsonaro: Um gesto sem consequências

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Declarações do presidente americano não alteram o curso da justiça brasileira e servem apenas como retórica política

No dia 7 de julho de 2025, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, publicou em sua rede social, Truth Social, uma mensagem em defesa do ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro, chamando os processos judiciais contra ele de “caça às bruxas” e exigindo que “deixem Bolsonaro em paz”.

A declaração, amplamente repercutida na imprensa internacional, foi interpretada como uma tentativa de pressionar o Judiciário brasileiro, em especial o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, relator dos casos envolvendo Bolsonaro.

Contudo, tais declarações são inócuas, não afetam a inelegibilidade de Bolsonaro nem as decisões judiciais no Brasil, sendo apenas gestos políticos de Trump para galvanizar a direita global, sem efeitos práticos concretos. Elas também terminam servindo apenas como manobra política de Trump para desviar o foco de seus próprios problemas internos, como a rixa com Elon Musk, o aumento da dívida pública, a crescente desigualdade e a queda de sua popularidade.

A inelegibilidade de Jair Bolsonaro, determinada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) até 2030, é resultado de condenações por abuso de poder político e uso indevido de meios de comunicação durante a campanha de 2022, quando disseminou desinformação sobre as urnas eletrônicas. Além disso, Bolsonaro é réu no STF por tentativa de golpe de Estado em 2022, acusado de liderar uma organização criminosa com o objetivo de subverter a democracia.

Esses processos seguem ritos constitucionais e legais, sob a jurisdição exclusiva do Brasil, um país soberano. As palavras de Trump, por mais estridentes que sejam, não possuem qualquer peso jurídico para interferir nessas decisões. Como destacou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva em nota oficial, “a defesa da democracia no Brasil é um tema que compete aos brasileiros. Somos um país soberano. Não aceitamos interferência ou tutela de quem quer que seja”.

A ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, reforçou a posição, afirmando que Trump “deveria cuidar dos seus próprios problemas” e que o Brasil não é mais subserviente aos Estados Unidos, como no período bolsonarista.

As declarações de Trump também se inserem em um contexto de articulação da extrema-direita brasileira nos Estados Unidos, liderada por figuras como Eduardo Bolsonaro, filho do ex-presidente, que se licenciou do mandato de deputado federal e se mudou para os EUA em março de 2025alegando perseguição política. Eduardo tem se reunido com parlamentares republicanos e influenciadores de direita, como o ex-estrategista de Trump, Steve Bannon, na tentativa de pressionar por sanções contra Alexandre de Moraes.

Outros foragidos da justiça brasileira, como o blogueiro Allan dos Santos e a deputada Carla Zambelli – condenada a dez anos de prisão por invasão de sistemas judiciais e falsidade ideológica –, também buscam apoio nos EUA, fora do alcance da justiça brasileira.

Apesar de o STF ter solicitado a inclusão de Zambelli na lista de procurados da Interpol, a cooperação internacional esbarra em limitações, especialmente porque os EUA não consideram essas figuras como asiladas ou alvos prioritários.

As supostas sanções contra Alexandre de Moraes, mencionadas por aliados de Trump e Eduardo Bolsonaro, carecem de viabilidade prática. Parlamentares republicanos, como Marco Rubio Chris Smith, sugeriram punições com base na Lei Global Magnitsky, que permite sanções a estrangeiros por violações de direitos humanos ou corrupção. No entanto, especialistas, como Adam Keith, da Humans Rights First, apontam que aplicar essa lei contra um juiz por decisões judiciais seria “um uso grave e sem precedentes”, restrito a contextos de ditaduras violentas.

Além disso, a Justiça americana já rejeitou tentativas de enquadrar Moraes, como no processo movido pela Trump Media & Technology Group e pela plataforma Rumble, que acusaram o ministro de violar a Primeira Emenda dos EUA ao ordenar a suspensão de contas de influenciadores brasileiros.

A juíza federal Mary Scriven esclareceu, em fevereiro de 2025, que não há base legal para um tribunal americano revisar decisões do STF sem cooperação jurídica internacional formal. Moraes, por sua vez, permanece firme em suas decisões, minimizando as pressões externas.

O STF, em uníssono com o governo brasileiro, reafirma a soberania nacional e a independência do Judiciário. As ameaças de sanções, como restrições de visto ou bloqueio de ativos, não alteram o curso dos processos no Brasil, já que Moraes não depende de acesso aos EUA para exercer suas funções.

A narrativa de “perseguição política” alimentada por Trump e bolsonaristas serve apenas para mobilizar a base de apoiadores, mas não encontra eco nas instituições brasileiras, que seguem operando dentro da legalidade.

Quanto ao processo movido pela Trump Media contra Moraes na Flórida, as chances de prosperar são mínimas. A ação questiona a autoridade do ministro para bloquear conteúdos na Rumble e na Truth Social, mas esbarra em barreiras legais sólidas.

A Justiça americana não tem jurisdição sobre decisões de um juiz estrangeiro em um país soberano, como destacou o jurista Paulo Lugon, da Aliança Brazil Office. O processo é visto como uma manobra política para desgastar Moraes e o STF, mas não deve resultar em penalidades concretas. No máximo, pode intensificar a retórica anti-Brasil entre setores da direita americana, sem impacto jurídico relevante.

As possíveis consequências de toda essa movimentação são, sobretudo, diplomáticas. Uma sanção formal contra Moraes, embora improvável, poderia azedar as relações entre Brasil e EUA, as duas maiores nações do hemisfério ocidental. O jornal The New York Times alertou que tal medida poderia provocar uma “ruptura diplomática”.

O governo Lula, por meio do Itamaraty, já sinalizou que responderá com firmeza a qualquer tentativa de ingerência. No entanto, a cautela prevalece, pois o Brasil busca manter canais de diálogo com os EUA em temas como comércio e meio ambiente, apesar das tensões.

Internamente, a defesa de Trump a Bolsonaro reavivou debates sobre anistia aos envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023, mas a proposta enfrenta resistência no Congresso e no STF.

Os problemas internos de Trump: uma cortina de fumaça para a defesa de Bolsonaro

A intervenção de Trump em favor de Bolsonaro parece uma tentativa de desviar a atenção de suas crescentes dificuldades domésticas. Um dos maiores desafios é sua rixa pública com Elon Musk, ex-aliado que investiu cerca de US$ 300 milhões em sua campanha de reeleição em 2024. Musk, insatisfeito com a aprovação do “Big Beautiful Bill” – um pacote fiscal de Trump que elimina subsídios para veículos elétricos e aumenta a dívida pública em US$ 3,3 trilhões até 2034, segundo o Committee for a Responsible Budget – anunciou a criação do America Party, uma terceira via política para disputar cadeiras no Congresso em 2026. Trump reagiu chamando Musk de “louco” e ameaçando cortar contratos federais de suas empresas, como SpaceX e Tesla, que dependem de bilhões em subsídios.

A dívida pública americana, já em 120% do PIB, é outro problema crítico. O pacote fiscal de Trump, criticado por Musk e analistas, pode elevar o déficit em até US$ 5,5 trilhões se suas medidas temporárias forem tornadas permanentes, segundo o Committee for a Responsible Budget. Isso agrava a percepção de instabilidade econômica, especialmente em um contexto de desigualdade crescente.

Dados do Pew Research Center mostram que a disparidade de renda nos EUA atingiu níveis recordes, com o 1% mais rico detendo 32% da riqueza nacional em 2024, enquanto políticas de Trump, como cortes de impostos para os mais ricos, intensificam o problema.

A popularidade de Trump também está em declínio. Segundo pesquisa Economist/YouGov de junho de 2025, 52% dos americanos desaprovam sua gestão, com reprovação particularmente alta em temas econômicos (-10 em empregos e economia, -18 em inflação). Esse cenário contrasta com o início de seu mandato, quando sua aprovação chegou a 46%.

A briga com Musk, aliado influente entre republicanos, e a percepção de descontrole fiscal minam sua base de apoio, especialmente entre republicanos não alinhados ao movimento MAGA

Em suma, a intervenção de Trump em favor de Bolsonaro é um gesto vazio, uma bravata que ecoa mais nas redes sociais do que nos tribunais. A justiça brasileira segue seu curso, imune às pressões externas, enquanto a soberania nacional é reafirmada como princípio inegociável.

A extrema-direita, tanto no Brasil quanto nos EUA, pode continuar sua campanha de narrativas, mas a realidade jurídica permanece inalterada: Bolsonaro é inelegível, réu e incapaz de reverter seu destino político por meio de aliados internacionais. Por Alan.Alex / Painel Político

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