Na busca pela ‘vulva perfeita’, Brasil é líder em cirurgias na ‘ppk’: saiba o que é a labioplastia e quando é indicada

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Cirurgia íntima feminina: questão de saúde ou só estética? — Foto: Dainis Graveris/Pexels

Cirurgia íntima feminina: questão de saúde ou só estética? — Foto: Dainis Graveris/Pexels

O Brasil é recordista mundial em cirurgias íntimas femininas. Só em 2020, a labioplastia (entenda o que é a cirurgia mais abaixo) foi feita por 20.334 mulheres no país, segundo a Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética (Isaps, na sigla em inglês). Os Estados Unidos ocupam o segundo lugar, com 13.697 cirurgias realizadas.

A Isaps reúne dados de procedimentos cirúrgicos e não cirúrgicos desde 2013 e o Brasil está no topo da labioplastia desde o início. Naquele ano, foram 13.683 procedimentos registrados.

Para a ginecologista Lucia Alves da Silva Lara, presidente da Comissão Nacional Especializada em Sexologia da Febrasgo (Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia), a busca pela labioplastia muitas vezes é só estética. Mulheres buscam a cirurgia porque acreditam na “vulva perfeita”.

“Existe um questionamento: qual seria a vulva perfeita? Existe uma variação, padrão de medidas, de dimensões? Isso seria de extrema importância para estabelecer normas para uma labioplastia adequada, mas isso não existe”, alerta a ginecologista da Febrasgo.

Flávia Fairbanks, mestre e doutora em ginecologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), concorda e mostra uma preocupação com esse “conceito estético”.

O que nos preocupa é buscar a cirurgia baseada em um conceito estético, um padrão estético que pode ser diferente daqui uns anos. Se não conseguimos nem definir um padrão para o corpo feminino, quem dirá para a região vulvar”, diz Fairbanks.

Aliás, vale sempre lembrar o que é a vulva e o que a vagina (sim, são coisas diferentes!). Vulva é o nome dado para a parte externa do aparelho genital feminino, enquanto a vagina é uma cavidade dentro da vulva.

O que é a cirurgia e quando ela é indicada?

Antes de mais nada, é preciso deixar claro que a labioplastia não provoca melhorias sexuais, ela traz apenas mudanças físicas.

Dito isso, a cirurgia de redução dos pequenos lábios remove a pele e a mucosa que se “projetam” para fora dos grandes lábios. Ela tira esse “excesso”. Ela pode ser feita tanto com anestesia local quanto geral e a paciente é liberada algumas horas após ao procedimento.

Anatomia da vulva — Foto: Arte g1

Anatomia da vulva — Foto: Arte g1

Apesar de parecer simples, Fairbanks aponta que não devemos banalizar a labioplastia, já que o procedimento remove uma parte do tecido do corpo (que não tem como refazer) e requer cuidado de uma equipe de saúde. A recuperação é rápida e a mucosa se estabelece entre uma e duas semanas.

“Os pontos são absorvíveis, não precisa retirar. A paciente precisa ter cuidado com a higiene pessoal, evitar entrar em locais contaminados durante um mês, como piscina ou mar, e a relação sexual vai depender da recuperação – entre um mês e 45 dias”, completa a doutora em ginecologia.

Como a cirurgia não é reversível, a mulher deve pensar bem antes de realizar o procedimento.

E quando ela é indicada?

A indicação fica muito na mão da paciente, pois é ela que sente o desconforto com a vulva. “Precisa ser a demanda da mulher. Quando ela procura o médico, esse especialista precisa utilizar de todo o seu conhecimento para fazer o julgamento. Se a cirurgia interferir na função do órgão, ele precisa discutir e se negar a realizar”, comenta Lucia Lara, presidente da Comissão Nacional Especializada em Sexologia da Febrasgo.

Segundo o Colégio Americano de Obstetras e Ginecologistas (ACOG, na sigla em inglês), a cirurgia pode ser indicada em algumas situações:

  • Hipertrofia ou assimetria dos pequenos lábios percebida pela mulher e que causa desconforto com atividades esportivas ou uso de roupas, e dor ou aprisionamento intravaginal dos pequenos lábios durante a penetração vaginal;
  • Alterações vaginais devidas à gravidez ou a lesão obstétrica que afetam a aparência da genitália ou interferem na sensação prazerosa ao coito;
  • Frouxidão vaginal pós-parto que interfere na satisfação sexual da mulher

Flávia Fairbanks explica que o procedimento não é novo e que, antigamente, existiam indicações específicas, que não eram estéticas, como a hipertrofia (com desconforto) e dificuldades nas relações sexuais com penetração – os pequenos lábios podiam entrar no canal vaginal.

E o que seria esse desconforto? “A hipertrofia é um aumento dos pequenos lábios em relação aos grandes lábios. A mulher sente um incômodo quando coloca calça, roupa mais apertada, sente vergonha quando coloca um biquini. Como não há regressão dos pequenos lábios (assim como as orelhas), o indicado é o tratamento cirúrgico”, exemplifica a especialista.

Mulheres na pós-menopausa também podem ir atrás do procedimento. Isso porque, segundo Fairbanks, os grandes lábios “emagrecem” por falta de hormônio.

“A vulva gordinha está ligada a questões hormonais. Com o tempo ela vai diminuindo e os pequenos lábios passam a assumir um tamanho maior. Algumas mulheres podem acabar se incomodando com isso”, diz a ginecologista.

É normal que vulvas tenham todas as formas e tamanhos — Foto: master1305/freepik

É normal que vulvas tenham todas as formas e tamanhos — Foto: master1305/freepik

Toda ppk é linda e não deve ser catalogada

É normal que vulvas tenham todas as formas e tamanhos. Como já dissemos acima, não existe um “padrão de beleza” vulvar. Por isso, a mulher deve procurar o procedimento se ELA quiser e não por uma pressão da “sociedade”.

“Não sou contrária ao procedimento, mas é extremamente problemático a mulher que não tem problema ou uma indicação ser convencida que seu padrão de vulva não é adequado. Eu não vejo pessoas catalogando mãos, pés. De onde tiraram isso de catalogar a vulva?”, questiona Fairbanks.

A especialista lembra que muitas mulheres não são estimuladas a conhecer o próprio corpo, a olhar a vulva e a vagina. Inclusive, estudos já mostraram que as pessoas não sabem onde fica o clitóris e a uretra (veja mais aqui).

“Se você não conhece o seu e é apresentado para um modelo, você acha que o seu está errado”, finaliza a ginecologista. Por Mariana Garcia, g1