A crise é profunda. Oportunidade histórica para mudanças. Cunha e Renan não assumirão a presidência

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Parte 1 – “Mude tudo para que tudo fique como está” (leopardismo político) ou agora é chance para o Brasil promover mudanças profundas na sua vida política, econômica, social, educacional e ética?
Para o cientista político Carlos Pereira, “o Brasil vive um momento ímpar, uma oportunidade histórica de definir seu futuro. Se será fundamentalmente ancorado na impessoalidade, na competência e na meritocracia; ou nos panos quentes, no acordo de elites políticas que se sentem ameaçadas diante de processos político-judiciais”. Qual caminho adotará o PMDB?
O caminho da continuidade
Se o novo governo escolher (contra a vontade popular) o caminho da continuidade, não deixaremos de ser uma república pouco federativa e bastante cleptocrata, porque os donos dos poderes corrompidos (político, administrativo, judicial, militar, econômico, financeiro e corporativo), alguns apanhados recentemente pela Lava Jato, sempre quiseram que ele fosse assim. De tempos em tempos as oligarquias “tudo mudam para que tudo fique como está” (algo assim foi dito por Tancredi, sobrinho de Fabrizio de Salinas, personagem central do romance “O Leopardo”, de Tomasi di Lampedusa). “Tudo isso não deveria durar, mas [ainda] vai durar” (diz Salinas). Por quê?
Se o PMDB se dobrar à tradição, já sabemos que as oligarquias brasileiras (mais precisamente, os donos dos poderes que pilham e que corrompem) só promovem reformas “superficiais e enganadoras” (Sérgio Buarque de Holanda, Raízes do Brasil) (para que tudo fique como está). A substituição de um grupo das elites por outro no comando do país é “um remédio totalmente aleatório”, quando não se promovem as reformas profundas necessárias. Mais: na república dos bacharéis, “acreditamos que a letra morta das leis pode de modo enérgico influir ou mudar o destino do povo” (Holanda). Ledo engano! Sem mudar a essência dos donos do poder nunca fabricaremos uma nação próspera. Eles normalmente pensam como Salinas e agem como Tancredi: “que tudo mude temporariamente para que tudo fique como está” (ver E. Gaspari).
A tendência natural seria a política “dos panos quentes” (abafamento)
É muito difícil fazer previsões, sobretudo em relação ao futuro (frase de autoria controvertida). Pelo seu histórico, o natural seria supor que o PMDB irá adotar uma política de “panos quentes” (que faz parte da operação abafa tudo). As razões para isso:
Temer (PMDB-SP), uma vez consumado o impeachment de Dilma, é o próximo inquilino do Palácio do Planalto. Pode, no entanto, estar assumindo a presidência da República por um curto período: há grande possibilidade jurídica de cassação da chapa Dilma-Temer, pelo TSE. Motivo: corrupção eleitoral (a campanha deles de 2014 foi descaradamente criminosa: propinas foram transformadas em “doações oficiais”, declaradas à Justiça eleitoral, e isso significa lavagem de dinheiro; houve também caixa 2 e caixa 3, como a propina da Engemix, que teria dado R$ 1 milhão para Temer, “por fora” (há delações contra Temer e o PMDB da Engemix, UTC, Andrade Gutierrez, Léo Pinheiro, Delcídio etc.).
Dilma (PT) está sendo retirada do governo. Motivo: PC4 (deixou faltar Pão, Circo – consumismo -, Confiança, Competência administrativa e, de sobra, seu governo está profundamente próximo da Corrupção). Não há governança que resista (no mundo democrático) quando presentes todos os vetores do PC4. Isso vale como alerta para o PMDB, que pode fazer alguma coisa positiva no campo da economia (inflação, desemprego, estabilidade cambial, crescimento econômico), mas talvez não tenha muito o que promover para impedir os avanços da Lava Jato (que já reuniu provas contra vários dos seus próceres, que somente aguardam o momento da condenação). Continua.
*Luiz Flávio Gomes, jurista e coeditor do portal “Atualidades do Direito”. Estou no [email protected]